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    Argentina de Milei: tão longe de Beijing, tão perto de Washington   Marina Morena Caires   Durante sua campanha eleitoral, Javier Milei, atual presidente de extrema-direita da Argentina, deixou claro seu alinhamento com princípios neoliberais e anarcocapitalistas. Ele defende a implementação de um Estado mínimo no país, com a redução da máquina pública, o corte de programas assistencialistas e a manutenção de uma economia aberta e de livre mercado. Coerente com essa visão, Milei expressou abertamente sua rejeição a relações com os “comunistas” chineses (Giménez, E., 2024) e manifestou o desejo de estreitar laços com os Estados Unidos. Contudo, quase um ano após sua tomada de posse, a realidade parece tornar difícil para o líder ultraliberal manter suas promessas de campanha. A China, segundo maior parceiro comercial da Argentina — atrás apenas do Brasil (Statista, 2024) —, representa um vínculo difícil e doloroso para Milei romper. Os acordos firmados por antigos governos com o gigante asiático e a aparente impossibilidade de desatrelar a recuperação argentina da cooperação com Beijing fizeram com que o presidente tivesse que reconsiderar suas rígidas medidas anti-comunistas.  No entanto, o retorno de Donald Trump à Casa Branca pode indicar o acirramento de laços com os EUA e o afastamento ainda maior da segunda potência mundial. Neste contexto, esta análise busca avaliar o estado das relações entre Buenos Aires e Beijing diante da atual política externa do governo Milei e explorar os desafios que ele poderá enfrentar com as mudanças no cenário político dos Estados Unidos.   Política externa de Milei: muita ideologia e pouco diálogo A cúpula do G20, que ocorreu neste mês de novembro no Rio de Janeiro, proporcionou uma foto viral do presidente argentino protagonizando uma interação fria com Lula, que capturou o isolamento político de Milei no cenário internacional. Durante a mesma cúpula, o presidente argentino tornou difícil a aprovação da declaração final do G20, mediante posição contrária a temas de tributação progressiva, de igualdade de gênero e de objetivos de Desenvolvimento Sustentável (Paraguassu; Pineal, 2024).  Esse isolacionismo argentino em espaços multilaterais é resultado de uma tendência do  governo de Milei de conduzir sua política externa com fortes direcionamentos ideológicos neoliberais, anticomunista e anarcocapitalistas, juntamente ao pouco uso da diplomacia e dos canais convencionais, como o uso das plataformas do governo.  Desde sua campanha, Milei se apresenta de maneira bastante atípica do esperado de um candidato político, pelas suas falas inflamatórias, “teatrais” e pouco políticas na sua forma de expressar sua opinião sobre pautas sociais e econômicas (Urbano, 2023). As redes sociais se tornam o palco principal do atual presidente e da sua ex-chanceler, Diana Mondino, que utilizava suas contas no X mais do que a página oficial do Ministério das Relações Exteriores, criando um cenário altamente individualizado e ideológico da política exterior e uma “diplomacia virtual” (Doval, 2024).   A ideologia de Milei resultou em uma busca pelo afastamento do Mercosul, devido a sua concepção de que ela é uma organização composta por Estados fortemente atuantes na economia, contrariando sua visão neoliberal de mínima intervenção estatal (ibid.). Ademais, ele optou por não concretizar a adesão ao BRICS devido à presença de países comunistas no bloco (ibid.). Contudo, parece que para o presidente argentino ainda há alguns espaços multilaterais não “contaminados” por ideologias comunistas. No início de seu mandato, foi enviada uma carta de interesse à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sinalizando o interesse de adesão ao grupo, buscando investimentos de desenvolvimento, auxílio econômico e ganho de credibilidade (Ferreira, 2024). Há interesse também em maior participação na Organização Mundial do Comércio (OMC) e no Conselho de Segurança.  No atual governo, os intransigíveis posicionamentos do presidente eram encontrados com um discurso mais apaziguador e comparativamente moderado da sua ex-chanceler. A exemplo, Mondino se pronunciou favoravelmente ao Mercosul e visou apaziguar relações com a China, a despeito dos comentários do presidente (Doval, 2024; Villasenin, 2024). Sua demissão no final de outubro devido ao voto favorável ao fim do embargo estadunidense contra Cuba (Taddeo, 2024) comprovou o extremismo de Milei e sua intolerância ideológica. Dessa forma, entende-se, que o presidente conduz sua política externa para um caminho pouco pragmático e fortemente alinhado aos EUA, a despeito da tradição e do histórico argentino. Isso é evidente no caso de Cuba, no qual a Argentina há décadas apoiava o fim do embargo.   China e Argentina: esfriamento mútuo? Como é possível imaginar, os comentários pouco polidos de Milei afetaram a diplomacia com a China.  Contudo, a Argentina vinha sofrendo um esfriamento das relações com o país antes mesmo de Milei assumir a presidência com sua postura anticomunista.  O predecessor de Milei, Alberto Fernández, protagonizou, em seu governo, entre 2019 e 2023, diversos casos de afastamento e de paralisação das relações com Beijing, resultados de um acordo bilateral da então presidente Cristina Kirchner. Foi nele que a maioria dos projetos de infraestrutura da China na Argentina foram parados por questões de financiamento e outros problemas de licenças governamentais. Dentre eles, um reator nuclear de US$8 bilhões em Atucha III, duas represas no rio Santa Cruz, o trabalho no sistema de trilhos do Belgrano Cargas, além de outros grandes projetos (Ellis, 2024). Além disso, em 2023, a China trocou seu embaixador fluente em espanhol por um novo que não fala o idioma, desqualificando indiretamente a relação (ibid.). Contudo, o governo de Fernández, apesar de diversos impasses com os chineses, não buscava um afastamento abertamente, como Milei. Em realidade, o ex-presidente buscou diversas associações com Beijing. Nesse sentido, em 2021, o país se tornou membro do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (BAII), uniu-se à iniciativa chinesa do “Belt and Road” — ou “Rota da Seda” — um ano depois, e conseguiu ser aprovado para participar do BRICS em 2023 (Villasenin, 2024).  Do lado chinês, a vontade em cooperar e se relacionar com país sul-americano era clara. Desde 2004, a China declara abertamente seu interesse na Argentina e sua consideração do país como um parceiro estratégico na região, buscando criar laços institucionais mais profundos e apoiando a adesão da potência sul-americana em bancos e iniciativas asiáticas comandados por eles (ibid.). No entanto, sempre houve uma dificuldade institucional argentina em seguir em frente com as propostas, seja devido ao estado de crise do país, seja a questões de atraso burocrático do país.  Mesmo assim, a potência asiática buscou auxiliar o país em crises, como a da COVID-19,  com práticas como a de ajuda econômica por meio de swap cambial (Villasenin, 2024). O swap é um mecanismo em que dois agentes, neste caso dois Estados, se comprometem em trocar moedas ou dinheiro em determinadas datas e em parcelas, auxiliando nas reservas das Partes (Giménez, J., 2024). Para a Argentina, esse acordo, consolidado no governo de Cristina Kirchner, possibilitou o pagamento de dívidas com o FMI, sendo extremamente útil para o país.  Todavia, com a eleição de Milei e o pouco esforço para manter a relação, em dezembro de 2023, a China suspende crédito swap de US$6,5 bilhões. No acordo, a Argentina precisa de um “acordo programático” com o FMI, que ela estava tendo dificuldades de manter, e era necessário a manutenção de reciprocidade política e diplomática entre os países (Lucena, 2024). Esse sobressalto levou Milei a buscar novamente diálogo com o país. Em junho, o governo argentino buscou negociação com a China para estender o swap e impedir o pagamento de bilhões de dólares de volta ao país asiático (Bianchi; Madry, 2024).   A falta de comunicação por parte de Javier Milei também levou ao abandono da construção de usinas em Santa Cruz, pausadas no governo de Fernández, cujas negociações deveriam ser retomadas pelo novo governo, algo que ainda não aconteceu. Com isso, a companhia chinesa que financiava o projeto demitiu 1.800 operários e removeu suas operações do país (Azenha, 2024).  Assim, em março de 2024, pela primeira vez no ano, a China deixou de ser a segunda maior parceira comercial do país e passou a terceira posição, atrás da União Europeia (Giménez, E., 2024). Em outubro, o decrescimento das relações comerciais se manteve. De acordo com relatório do Instituto Nacional de Estatística e Censos (INDEC) de outubro de 2024, o intercâmbio comercial com a China registrou um saldo negativo de US$ 1.055 milhões de dólares, com diminuição de interanual nesse mês de 41,5% na exportação, principalmente pela queda de produtos primários. Além disso, houve aumento de 0,8% nas importações em relação a outubro de 2023. As compras realizadas pelos chineses dos produtos argentinos agora estão sendo direcionadas ao Brasil (Giménez, E., 2024), configurando um afastamento ainda maior dos antigos parceiros.  Essa situação fez com que Milei tivesse que tomar uma postura mais proativa com Beijing. Durante a cúpula do G20, o argentino realizou um encontro bilateral com Xi Jinping, configurando uma drástica mudança de postura (Catto, 2024). Com a necessidade de melhoria na economia e o pagamento das dívidas externas, perder a China como parceiro seria inviável.    Trump e o envolvimento norte-americano  Mesmo com essa virada de perspectiva, na qual Milei parece finalmente estar caminhando para uma condução de política externa mais voltada à manutenção de parceiros estratégicos e à recuperação econômica do que suas ideologias, a reeleição de Trump pode significar uma ameaça ao processo.  Não é segredo que ambos os líderes são extremamente próximos, sendo que Milei foi o primeiro presidente estrangeiro a encontrar o norte-americano após sua vitória nas eleições (G1, 2024). Além disso, os Estados Unidos têm um histórico de interferência nas relações sino-argentinas por meio de pressões, utilizando viagens e declarações para impedir acordos bilaterais. No governo de Biden, os EUA interferiram na construção da central Atucha III, na postergação da licitação 5G para dificultar a entrada de empresas chinesas que dominam o setor e no cancelamento do acordo de compra de caças chineses em troca de estadunidenses (Villasenin, 2024). Agora, um obstáculo ainda maior para as relações com Beijing é o fato de Trump, conhecido por sua postura firmemente anticomunista, manter uma agenda focada em conter a expansão chinesa nas Américas. Ademais, Milei fez dos Estados Unidos prioridade no campo de política exterior não só pelo alinhamento com os princípios políticos conservadores e economicamente liberais, mas também pela possível ajuda com questões de comércio e de recuperação econômica argentina. Laços mais fortes com os EUA podem significar condições mais favoráveis de financiamento no Fundo Monetário Internacional (FMI), além de apoio para a adesão à OCDE (Ferreira, 2024). Contudo, isso irá depender da atitude de Trump em relação a esses organismos durante seu mandato.  Mesmo que Milei encontre um aliado nesses aspectos, pode ser que não o encontre em outros. Ao passo que Trump tem uma política protecionista, especialmente no que diz respeito à indústria agrícola norte-americana, Milei busca o fim de tal  protecionismo para impulsionar o livre mercado e as exportações argentinas nesse setor dentro da OMC (ibid.), podendo significar uma rachadura na aliança mais esperada do atual presidente argentino. A promessa do presidente eleito de impor tarifas nos produtos importados da China também pode ser um contraponto entre os governos. Trump anunciou que quer aplicar um imposto de até 60% nos produtos chineses (Lynch, 2024), mantendo sua lógica protecionista de desenvolvimento do produto interno. No entanto, Milei, além de um defensor de livre mercado que prometeu redução de impostos aos eleitores, têm de controlar a inflação do país, que vem sendo feito por meio da redução de tarifas de importação (Olivieri, 2024). Os Estados Unidos se mantiveram um parceiro importante para a Argentina, ocupando a terceira posição no âmbito comercial, estando a frente da China em compra de exportações (Statista, 2024) e sendo o maior investidor direto do país no primeiro trimestre de 2024, com 19% de todos os investimentos externos diretos (Infobae, 2024). Ainda assim, o fato de os EUA parecerem mais interessados em investir no país não é suficiente para superar a influência da China. Portanto, o foco de Milei nos EUA seria uma escolha claramente ideológica, o que pode ter grandes consequências para a economia argentina, caso Trump não mantenha e amplie a parceria.   Conclusão A ascensão de Trump cria um empecilho maior para a China no que diz respeito à relação com a Argentina. É nítido que o país sul-americano não pode deixar de lado a parceria com a potência asiática, devido não só ao seu peso comercial, aos investimos em infraestrutura e ao swapcambial, mas também a sua atuação nos setores de mineração do lítio, de energias renováveis e digital (Ellis, 2024). Na mineração, as empresas chinesas ganham espaço junto às autoridades locais argentinas, trabalhando com governos provinciais. Já no setor digital, a infraestrutura de telecomunicações do país é liderada por grandes empresas como a Huawei que oferta serviços a grandes provedores (ibid.). Assim, a China se torna um ator-chave em algumas das indústrias e mercados mais básicos e estratégicos do país. Apesar disso, o discurso inflamado e as ações "anticomunistas" de Trump podem levar Milei a priorizar apenas questões básicas e urgentes, a exemplo o swap cambial como ocorreu recentemente, em vez de aproveitar o interesse chinês para impulsionar a economia. Isso pode resultar na paralisação ou avanço muito lento na retomada de projetos, enquanto ele aposta no aumento das exportações para os EUA. Beijing, aparentemente, não permanecerá buscando relações com o país, e é capaz de ocorrerem ainda mais retiradas de investimentos e levada do comércio a outros países da região, diminuindo a exportação de produtos primários argentinos em favor de outros países sul-americanos. O distanciamento de Beijing também aponta para o afastamento argentino dos blocos, dos bancos e das iniciativas que contam com capital chinês, desperdiçando uma chance preciosa da Argentina de adentrar em outros espaços do mercado global e buscar financiamento alternativo a suas crises, como nos fundos do BRICS.    Referências   AZENHA, Luiz Carlos. China retalia Argentina e abandona obra de usinas na Patagônia. Revista Forum, 14 mar. 2024. Disponível em: https://revistaforum.com.br/global/2024/3/14/china-retalia-argentina-abandona-obra-de-usinas-na-patagnia-155675.html. 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Acesso em: 24 nov. 2024   Main trade partners Argentina 2024. Statista, 2024. Disponível em: https://www.statista.com/statistics/1331248/main-trade-partners-argentina/. Acesso em: 24 nov. 2024.   MATHISEN, K. Trump’s new tariff approach targets trade imbalances. The Washington Post, 17 nov. 2024. Disponível em:https://www.washingtonpost.com/business/2024/11/17/trump-tariff-trade-imbalances/. Acesso em: 24 nov. 2024.   Milei visita Trump na Flórida e se torna primeiro líder estrangeiro a encontrar presidente eleito dos EUA após vitória nas urnas. G1, 15 nov. 2024. Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/noticia/2024/11/15/milei-visita-trump-na-florida-e-se-torna-primeiro-lider-estrangeiro-a-encontrar-presidente-eleito-dos-eua-apos-vitoria-nas-urnas.ghtml. Acesso em: 23 nov. 2024.   OLIVIERI, Fernando. Milei anuncia redução da tarifa de importação para combater inflação na Argentina. Exame, 28 ago. 2024. 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Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/milei-demite-chanceler-apos-voto-contra-embargo-a-cuba-substituto-e-embaixador-nos-eua/. Acesso em: 16 dez. 2024.    URBANO, João Paulo. Entre o Peso e o Dólar: A ascensão de Javier Milei. PET-REL, 18 dez. 2023. Disponível em: http://www.petrel.unb.br/destaques/214-entre-o-peso-e-o-dolar-a-ascensao-de-javier-milei. Acesso em: 24 nov. 2024.   VILLASENIN, L. El nuevo gobierno de Milei y China. Interacción Sino-Iberoamericana / Sino-Iberoamerican Interaction, 3 out. 2024. Disponível em: https://www.degruyter.com/document/doi/10.1515/sai-2024-0001/html. Aceso em: 24 nov. 2024.    

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    Lenira Oliveira   Nenhum grupo e nenhum país pode agir sozinho ou isoladamente. Tem de ser uma comunidade de nações que trabalhem como uma família global para enfrentar os desafios globais (António Guterres, 2024).   No dia 24 de outubro de 2024, ocorreu a 16° Cúpula dos líderes dos BRICS, em Kazan, na Rússia, que reuniu representantes de 36 países e de seis organizações internacionais, incluindo o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres (León, 2024). A primeira Cúpula - após a adesão de cinco novos membros ao agrupamento (Egito, Irã, Etiópia, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos) em janeiro de 2024 - resultou na Declaração de Kazan, que destacou logo em seu título (“Fortalecimento do Multilateralismo para o Desenvolvimento e a Segurança Globais Justos”) a questão do multilateralismo. A presente análise tem como objetivo investigar a forma pela qual o conceito de multilateralismo pode ser compreendido no âmbito dos BRICS. Nesse sentido, busca-se entender também se esse agrupamento de países realmente desafiam a Ordem Global vigente ao proporem uma nova perspectiva de desenvolvimento com vista a suprir as demandas dos países em desenvolvimento.   O conceito de multilateralismo   A definição mais tradicional de multilateralismo postula que ele se refere meramente à coordenação das relações entre três ou mais Estados de acordo com certos princípios (Ruggie, 1992), dando bastante ênfase à uma dimensão quantitativa. Em seu texto intitulado “Multilateralism: the Anatomy of an Institution” (1992), o autor Ruggie critica a definição do multilateralismo vinculada apenas ao seu aspecto numérico, visto que essa perspectiva engloba o que de fato o distingue, que é a dimensão qualitativa deste fenômeno. O autor busca na sua conceituação de multilateralismo evidenciar o aspecto das relações que são instituídas entre os Estados que participam desses arranjos interestatais. Portanto, o que distingue um regime multilateral de outros arranjos é que o primeiro coordena o comportamento de três ou mais Estados baseados em princípios de conduta generalizados (Ibid, p. 571). A dimensão qualitativa tem entre seus corolários à indivisibilidade e a reciprocidade difusa, isto é, os custos e os benefícios de um arranjo multilateral devem ser distribuídos entre os seus componentes, que podem antecipar a continuidade da cooperação coletiva ao longo do tempo (Ibid., p. 571-572).   Um balanço da Cúpula dos BRICS 2024   A Declaração de Kazan, publicada em ocasião da 16a Cúpula dos BRICS, destacou a posição dos líderes presentes na reunião sobre questões políticas e econômicas atuais. Dentre os aspectos geopolíticos abordados estão a guerra entre Rússia e Ucrânia e o conflito no Oriente Médio (BRICS summit…, 2024). Em ambos os casos, nota-se uma postura bastante cautelosa nas palavras utilizadas nesse documento, o que é justificado pela presença de países integrantes do grupo que estão envolvidos diretamente nesses conflitos – Rússia e Irã, respectivamente.   No entanto, o tema mais abordado na declaração foram as questões econômicas, como sanções, o sistema financeiro, dentre outros. De modo geral, é perceptível uma visão bem crítica a Ordem vigente e dominada pelos países desenvolvidos do Norte Global, de forma com que os países que compõe o agrupamento clamem por uma transformação na atual conjuntura do sistema internacional para uma Ordem que seja mais justa e inclusiva (Nota à imprensa nº 505, 2024). Apesar dos países que integram o grupo possuírem posicionamentos distintos em questões geopolíticas atuais – tendo até mesmo conflitos entre alguns deles, como no caso da disputa fronteiriça entre Índia e China -, nota-se um maior alinhamento entre esses países na pauta econômica, sobretudo, em fazer deste agrupamento um espaço capaz de desafiar às instituições financeiras existentes que pouco favorecem os países em desenvolvimento. Portanto, esses países se alinham quanto a necessidade de reforma no sistema financeiro vigente, mas possuem visões distintas em temas centrais, como questões geopolíticas, o que é um fator limitador para o alinhamento e a construção da Ordem que o grupo almeja.   O papel dos BRICS no debate sobre multilateralismo e suas limitações   Tendo em vista o conceito de multilateralismo, apresentado no texto do autor Ruggie (1992), e a proposta dos BRICS, enquanto um grupo de países que buscam desafiar a Ordem vigente dominada por países desenvolvidos do Norte Global, é possível postular que esse agrupamento de fato contribuiu para o avanço deste objetivo em comum. Os BRICS procuram reformular a Ordem Global ao criar instituições, como o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), que visam fortalecer a presença desses países nas estruturas existentes (Stuenkel, 2016, p. 39).  Segundo Stuenkel (2016), os BRICS não buscam reinventar as regras e as normas globais existentes, mas tão somente institucionalizar sua nova liderança global por meio das novas instituições criadas por eles (Ibid., p. 39-40). Dessa forma, o objetivo central deste agrupamento seria desafiar a hegemonia dos Estados Unidos, a fim de reduzir a dependência dos países do Sul Global das instituições e dos interesses do Ocidente (Ibid., p. 40). Além dessa crítica, Stuenkel avança ao pontuar que o interesse em mudanças na estrutura de organizações como a ONU, mais especificamente no Conselho de Segurança (CSNU) - composto por cinco membros permanentes (Estados Unidos, França, Reino Unido, China e Rússia) -, não é de fato compartilhado por todos os integrantes dos BRICS. Essa pauta, bastante defendida pelo Brasil, não é consenso dentro do grupo, devido a China e a Rússia já serem membros permanentes do CSNU (Ibid., p. 51).  Nessa perspectiva, questiona-se até onde os BRICS, como um grupo de países que se dizem ser porta voz dos anseios do Sul Global por uma Ordem mais justa e inclusiva, estão de fato focados em atingir esse objetivo ou se buscam apenas conquistar seus próprios interesses por meio deste grupo - o que não exclui a possibilidade de mudança, mas tem o potencial de limitar o seu escopo. Apesar dessa visão sobre o agrupamento ser de fato plausível, é inegável que os BRICS foram responsáveis por ampliar o questionamento da Ordem liberal do Ocidente, ao pautarem as questões dos países em desenvolvimento e criarem instituições alternativas - como o NBD -, além de alavancarem a pauta da desdolarização em um processo contra-hegemônico (Resende, 2023).   Considerações finais   O debate sobre o multilateralismo pode ser conectado e abarcado pela discussão dos BRICS, à medida que esse grupo se impõe como um espaço multilateral que almeja uma Ordem Global mais justa e inclusiva. No entanto, essa perspectiva pode ser questionada em até que ponto os países integrantes do grupo de fato desafiam a Ordem vigente e propõe a reconfiguração de sua estrutura para melhor responder às demandas dos países em desenvolvimento. Destarte, pode-se argumentar que o grupo realmente avançou no questionamento de uma Ordem Global liberal dominada pelos países do Ocidente. Por outro lado, o agrupamento não responde a todas às demandas dos países em desenvolvimento, inclusive não supre até mesmo algumas dos seus membros, à exemplo do anseio do Brasil pela reforma do CSNU, a fim da inclusão de novos membros permanentes. Portanto, com a inclusão de novos membros e parceiros nos BRICS, pode-se esperar um fortalecimento das instituições criadas pelo grupo e até mesmo projetos mais ambiciosos em seu escopo, mas seria muito ambicioso pensar que esse grupo será capaz de realizar uma total reconfiguração da Ordem Global em prol dos países em desenvolvimento, haja visto que isso iria ao encontro dos interesses de alguns membros do grupo.   Referências    BRICS summit: Key takeaways from the Kazan declaration. Reuters, 24 out. 2024. Disponível em: https://www.reuters.com/world/factobox-main-points-brics-declaration-2024-10-23/. Acesso em: 26 out. 2024.   LEÓN, Lucas Pordeus. Cúpula ampliada do Brics pede maior protagonismo do Sul Global. Agência Brasil, 24 out. 2024. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2024-10/cupula-ampliada-do-brics-pede-maior-protagonismo-do-sul-global. Acesso em: 26 out. 2024.   Nota à imprensa nº 505 - XVI Cúpula do BRICS – Kazan, Rússia, 22 a 24 de outubro de 2024 - Declaração Final. MRE, 24 out. 2024. Disponível em: https://www.gov.br/mre/pt-br/canais_atendimento/imprensa/notas-a-imprensa/xvi-cupula-do-brics-2013-kazan-russia-22-a-24-de-outubro-de-2024-declaracao-final. Acesso em: 27 out. 2024.   RUGGIE, John Gerard. Multilateralism: the anatomy of an institution. International organization, v. 46, n. 3, p. 561-598, 1992.   RESENDE, Ana Helena. BRICS: a counter hegemonic project?. PET-REL, 22 jun. 2023. Disponível em: http://petrel.unb.br/destaques/205-brics-a-counter-hegemonic-project-2. Acesso em: 15 nov. 2024.   STUENKEL, Oliver. The BRICS: Seeking Privileges by Constructing and Running Multilateral Institutions. Global Summitry, Vol. 2, Issue 1, 2016, p. 38-53.

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    Vítor Vieira Branquinho   Giovanni Arrighi em “O longo século XX” (1996), faz uma exposição teórico-histórica sobre como o capitalismo se desenvolveu ao longo das eras, mas, especificamente, as relações entre os Estados no tocante a esse modo de produção. Em sua categorização histórica, ele divide a ampliação do capitalismo em quatro grandes ciclos sistêmicos de acumulação capitalista: o genovês, o holandês, o inglês e o estadunidense (Arrighi, 1996).  É, assim, importante entender o que é o ciclo sistêmico de acumulação. Para que ele aconteça deve existir uma hegemonia no sistema, que, de acordo com Gramsci (2004) é um Estado - ou grupo de Estados - cuja influência é tamanha, ao ponto de alinhar as políticas externas dos Estados abaixo dele, de modo que, além dos vieses políticos e econômicos, os ideológicos e culturais estejam direcionados para o mesmo fim. Um exemplo disso é a Inglaterra durante a era industrial ou os Estados Unidos e a União Soviética no período da Guerra Fria. Esses Estados exerciam sua hegemonia sobre os Estados menores, apontando o modo de pensar e de fazer política; sobretudo, os interesses do hegemon eram destacados e o sistema convergia em direção a eles.     Além disso, há uma aliança entre o Estado e o capital: este é utilizado para crescer e possibilitar os objetivos daquele (Arrighi, 1996). O Estado utilizará do capital para se expandir e para ampliar ainda mais sua hegemonia e sua própria acumulação de riquezas. É apontado, dessa maneira, um processo de desenvolvimento e dependência entre os agentes - capital e Estado - que dá continuidade ao ciclo. Por fim, é importante notar que os períodos não são finitos em si mesmos, mas que cada intervalo  beneficia-se do crescimento do anterior, começando de onde o último parou. É nessa ideia que apresenta-se a conjuntura chinesa no cenário internacional. Os investimentos feitos pelo Estado chinês propulsionaram sua economia e abriram as portas para uma possível vaga como hegemonia global. Assim, o intuito dessa análise é entender como a China pode estar se apresentando como uma candidata a substituir o cargo do antigo hegemon no ciclo de acumulação e em quais aspectos ela precisa focar para concretizar esse processo.   O Estado empreendedor chinês     Hung (2018) irá demonstrar que o crescimento chinês só foi possível pela participação do país na nova ordem neoliberal, ou seja, no modelo capitalista internacional de livre-comércio, em que os países, como agentes, possuem uma relação de trocas comerciais. Para que esse crescimento aconteça, é necessário que haja uma aliança entre o poder estatal e as empresas privadas (Arrighi, 1996).      Nessa ordem, Polanyi (2000) afirma que a construção do capitalismo de livre-comércio foi um planejamento estatal, controlado e regulado pelo governo para que ele pudesse acontecer. Os constantes regulamentos, à medida que as trocas exigiam intervenção para funcionarem livremente, foram obra da mão estatal que visava o desenvolvimento desse modo de produção acumulador.  Por sua vez, a política externa chinesa, estabelecida pelo Partido Comunista Chinês, é baseada em três princípios - a soberania chinesa, a integridade territorial e a não interferência -, os quais estão enraizados na tradição do país e são fortemente utilizados com o propósito de servir os interesses do partido (Grimmel; Gurol, 2021). Esses princípios denotam um vínculo inseparável entre a soberania e o Estado forte, mostrando que, nesse sentido, a política externa chinesa funciona como uma extensão dos interesses econômicos e políticos do país (Giessmann, 2008). Assim, como Polanyi demonstra um Estado planejador, da mesma forma o Estado capitalista chinês propõe um projeto que visa sua propulsão no sistema internacional vigente (Hung, 2018).      Nos últimos sessenta anos, é demonstrado a habilidade chinesa de se especializar e de acumular, cada vez mais, novas e mais complexas capacidades, algo que é notado na diversificação e na sofisticação da sua cesta de produtos (Felipe et al., 2012). Um exemplo é a marca de carros elétricos chinesa, Build Your Dreams (BYD). Fundada na cidade de Shenzhen, China, antes era uma produtora de baterias e se tornou uma fábrica de carros elétricos. A produção de baterias, que pode ser considerada como uma vantagem inicial,  foi substituída pela fabricação de motores de carros (BBC News, 2023). A empresa cresceu na bolsa de valores e, com isso, como diversificação, adquiriu uma marca estatal de carros.  Nessa mudança de produto, o governo chinês, que buscava ocupar espaço no mercado mundial de energia renovável, induziu incentivos e subsídios fiscais para que houvesse uma produção maior nesse setor. Assim, a marca se encontrava em um contexto excelente para se expandir. Hoje, a China domina a produção mundial de veículos elétricos - e grande parte devido à BYD (BBC News, 2023). Outro exemplo é a criação da Nova Rota da Seda – a Belt and Road Initiative (BRI) –, uma iniciativa voltada para a internacionalização do desenvolvimento chinês. Dispondo do financiamento de um grande conjunto de bancos públicos e comerciais, a China lançou uma série de programas de investimentos, focados principalmente em infraestrutura, em 2013, com Xi Jinping, e, a partir de então, tem dado sequência a eles. O projeto inicial promoveu grandes planejamentos de construção civil  nos países parceiros, com o viés de realizar uma integração econômica regional. Essa iniciativa tem sido responsável por condicionar e potencializar os fluxos de investimentos diretos aos países aliados à BRI e estabelecer um contexto cujo soft power chinês possa ser exercido (Mendonça; Filho; Oliveira, 2021). Além do setor automotivo e de infraestrutura, a China demonstra um papel importante nas redes de produção global (Schindler et al, 2023). Inicialmente, elas eram inseridas como produtores, mas ao longo do tempo foram se aproximando da fronteira tecnológica. Em 2015, Pequim lançou a estratégia industrial Made in China 2025, cuja ambição era transformar o país no líder manufatureiro até 2049. Para isso, buscou melhorar sua inovação, integrar a indústria e a tecnologia e promover serviços relacionados à manufatura nos seguintes setores: nova tecnologia de informação, maquinário altamente especializado, equipamento aeroespacial, equipamento de engenharia oceânica, carros elétricos, equipamentos elétricos, maquinário agrícola, materiais novos como polímeros e equipamentos na área da saúde (The State Council…, 2015). Em 2021, foi injetado, somente nessa política, 31 bilhões de dólares (Kawase, 2022). Logo, é notório o esforço chinês para ser dominante nesse setor.     Esses três exemplos - setor automobilístico elétrico, infraestrutural e de redes de produção - fazem parte de um conjunto que indica a projeção da China para ocupar uma posição relevante no sistema capitalista internacional. Ela traz consigo o forte peso de algumas indústrias e também de alguns setores estratégicos nos quais exerce uma importante função, rivalizando com a potência americana, atual hegemon do ciclo de acumulação (Schindler et al, 2023). De modo geral, as políticas econômicas do país vêm ampliando sua capacidade capitalista de acumulação e empreendedorismo, gerindo seus recursos de modo a se qualificar como uma grande potência econômica (Grimmel, Gurol, 2021; Arrighi, 2008).    O problema da hegemonia Todavia, na perspectiva de Arrighi, a hegemonia que se instala no ciclo de acumulação possui características para além do âmbito econômico, como o político e o cultural (Arrighi, 1996). A hegemonia americana, alicerçada sobre o grande domínio econômico e cultural que exerceu sobre o sistema internacional ao longo da Guerra Fria e no curto período sequencial, percebe sua decadência a partir de 1995 (Arrighi, 2008). Desse ano em diante, essa hegemonia se mantém devido aos arranjos institucionais realizados pelo país, como uma forma de estratégia para guardar seu posto. Entretanto, quando um Estado hegemônico não consegue mais expandir seu sistema de Estados de uma forma benéfica para seus membros, tem-se aí uma crise da hegemonia (Arrighi, 2008).  Mesmo assim, os Estados Unidos ainda ocupam uma posição importante em outros núcleos, como na própria liderança institucional, apesar de não conseguir mais expandir seu sistema de Estados de maneira tão benéfica, organizações como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) ainda possuem um papel diretor na ordem internacional (Santana, 2016; Rynning, 2019).  A Organização para Cooperação de Xangai (OCX) é uma tentativa - que vem se mostrando bem sucedida (Anadi, 2024) - de saída chinesa do domínio institucional americano. Ela consiste em uma organização cujo objetivo é a cooperação entre seus membros, em grande maioria asiáticos, direcionando seus recursos a solucionar problemas locais, como questões econômicas, culturais, étnicas e comerciais (Anadi, 2024). A BRI também é outro esforço institucional chinês de ampliar suas relações com os outros países, focando em uma integração regional e econômica (Mendonça; Filho; Oliveira; 2021). Com essas iniciativas, a China vem buscando sair do monopólio institucional americano e vencer mais um impasse para exercer sua hegemonia. Outra questão é o aspecto cultural. Hung (2018) argumenta que a liderança chinesa no mercado mundial acontece sem que o país estabeleça uma hegemonia no sentido gramsciano. Ela está pautada em um pragmatismo econômico, voltado para produção e acumulação econômicas. Seus esforços, inclusive os institucionais, se apresentam como mais uma ferramenta de propulsionar suas relações econômicas (Grimmel; Gurol, 2021).  Ou seja, aquela estratégia americana de exportar seu American Way of Life, responsável por moldar o pensamento ocidental, não ocorre no perfil chinês. O impacto disso no estabelecimento de uma hegemonia consiste em não ser capaz de moldar as políticas dos países nos quais exerce sua influência (Arrighi, 1996). Sem esse arranjo ideológico, a hegemonia se transforma em um domínio (Watson, 2004 [1992]), o que descaracteriza o ciclo de acumulação.   Conclusão Em suma, é notória a posição chinesa na nova ordem neoliberal como um país que contou com um intenso boom de crescimento e que se mantém – sem sinais de declínio – no pódio das potências econômicas. Os investimentos infraestruturais e de base feitos ao longo dos anos foram essenciais para o futuro que o país almeja ter. O país soube realizar um casamento entre as políticas estatais e o capital privado para se ascender, empreendendo os setores que lhe trariam retorno e aplicando medidas que fomentariam sua indústria. Entretanto, o ciclo de acumulação sistêmico exige uma hegemonia para seu funcionamento. Os Estados Unidos estão em um estado de decadência, o que possibilita que outros países possam disputar para substitui-lo e a China se mostra com boas condições para fazê-lo. Sua projeção econômica é algo que se destaca na ordem internacional contemporânea, não obstante, para de fato ocupar o papel de hegemon, é necessário que ela alcance os outros fatores que caracterizam-no, como o institucional e o cultural. Portanto, caso esse quadro se mantenha, o sucesso chinês poderia vir de uma maneira diferente das vistas até hoje e que Arrighi não discorre a respeito. A falta de um controle institucional e de uma influência cultural poderá ser um impasse que mine a capacidade chinesa de concretizar a transição hegemônica e, caso se concretize, de se manter nesse papel hegemônico por muito tempo.   Referências ANADI, Anadi. New Regionalism and Norm Creation: A Case of Shanghai Cooperation Organization. Journal of Strategic Security, 2024, vol. 17, n. 1, pp. 100-111. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/48766109. Acesso em: 09 de novembro de 2024.   ARRIGHI, Giovanni. O longo século XX: dinheiro, poder e as origens do nosso tempo. São Paulo: Contraponto/Unesp, 1996.   ARRIGHI, Giovanni. Adam Smith em Pequim: origens e fundamentos do século XXI. São Paulo: Boitempo, 2008.   BYD: O segredo do sucesso da gigante chinesa que já produz mais carros elétricos do que a Tesla. BBC News. Cingapura, 2023. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/c8744xeyz2lo. 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  • Destaques

    New challenges, new threats:¹ Os desafios do futuro presidente norte-americano Cecília Dias       Os Estados Unidos da América (EUA) têm enfrentado uma série de crises internas e externas que testam não apenas os limites de sua liderança global, mas também o próprio tecido social da nação. Neste momento, a economia encontra-se fragilizada, o cenário internacional se torna cada vez mais instável e a sociedade americana, profundamente polarizada. A questão que permanece é: como o próximo presidente dos EUA enfrentará esses desafios simultâneos?  Com Kamala Harris e Donald Trump como os principais candidatos à presidência, a disputa eleitoral se mostra acirrada, apresentando margens mínimas entre ambos, conforme apontado pela ABC News (2024). Independentemente de quem assuma a Casa Branca nos próximos quatro anos, é inegável que o novo líder terá de manejar crises acumuladas ao longo da última década. É uma tarefa difícil sintetizar as intercorrências que levaram os Estados Unidos ao cenário atual. Contudo, esta análise propõe trazer luz aos principais desafios que o futuro presidente enfrentará, explorando forças políticas e históricas que culminaram neste momento decisivo.   A sumária crise de legitimidade política Desde o 11 de setembro, a securitização tomou conta do ideário norte-americano. A Invasão ao Iraque em 2003, exemplo de ilícito internacional, foi justificada pela possível ameaça que Saddam Hussein representava contra a segurança da nação — sem provas, no entanto, da inteligência dos EUA (Evans, 2004). A Guerra no Afeganistão em 2001 também se liga a esse cenário, e ambos os eventos foram persuadidos pela retórica neoconservadora da “missão da América de exportação da democracia” (Castro Santos, 2010). Tais eventos, contudo, reverberaram na danificação da imagem internacional dos EUA na época — não somente pelo fato de que a invasão não foi aprovada pelos membros das Nações Unidas, mas também pelo resultado catastrófico na salvaguarda humanitária. Principalmente no que tange à Guerra do Afeganistão, o fracasso norte-americano em manter as forças talibãs fora do poder, mesmo depois de 20 anos de intervenção, sintetiza esse contexto. Assim, as sucessivas intervenções norte-americanas na região do Oriente Médio, sob o auspício de uma “Guerra contra o Terror”, mais influenciaram na perda de legitimidade da nação do que em uma efetiva subtração dos grupos terroristas. Resultado disso é que a multiplicação de células terroristas independentes transnacionais, como as do Estado Islâmico, em muito são decorrentes da desestabilização central do grupo após ataques contra suas bases pelos EUA (BBC, 2017). Além disso, os subprodutos dos ataques e das atuações norte-americanas resultaram em milhares de mortes e em uma instabilidade política e econômica na região, sem que fosse impedido um spillover da violência local (Pecequilo e Forner, 2017). Dispor somente às intervenções norte-americanas no Oriente Médio o efeito da perda de credibilidade de seus líderes é minar toda uma conjuntura de fatores sociais, econômicos e políticos da história recente. Por isso, ressalto somente que o 11 de setembro serve de marco para inaugurar uma era de perda de legitimidade das instituições, tanto pela fraca crença da população quanto dos atores internacionais no país, insuflada, ainda, pela Crise financeira de 2008.  Essa crise de legitimidade demandou uma nova representação para tornar os Estados Unidos grande novamente, culminando na eleição de Donald Trump. Presença à parte na história norte-americana, não é sabido até que ponto Trump afigura-se como uma síntese das manifestações radicais de grupos extremistas, como visto na invasão ao Capitólio. Todavia, sua administração representou não apenas uma mudança política, mas sim uma reformulação cultural da presidência, que desafiou os pilares do liberalismo que há décadas definiram o posicionamento dos EUA no cenário global (Pecequilo, 2016). O retrocesso em diversos assuntos de matéria social, migratória, de saúde e ambiental evidenciou uma ruptura com as normas estabelecidas e uma polarização crescente na sociedade americana (Ibid.). Nesse sentido, a administração de Trump promoveu políticas que favoreciam uma narrativa nacionalista e anti-imigração, acentuando divisões internas e alimentando o ressentimento entre diferentes grupos sociais. Soma-se, também, um estudo da Universidade Cornell indicando que o ex-presidente foi responsável por quase 40% das desinformações que circularam em aproximadamente 38 milhões de artigos publicados de janeiro a maio de 2020 (BBC, 2020). Por isso, os desafios ante a reversão dessas crises estabelecidas marca a administração de Biden e reflete o cenário norte-americano desde 2001: lideranças instáveis, com a imagem da nação corroída no ambiente internacional; crise política, com a ascensão de movimentos radicais apoiados pelo ex-presidente; e crise econômica, com causas diretamente ligadas à gestão da pandemia. Desse modo, o presidente implementou uma série de programas de recuperação econômica e fortificou as relações da nação com as alianças, que haviam sido deixadas de lado na gestão Trump. Ele também operacionalizou uma imagem de que “os EUA estavam de volta”, seu slogan de campanha. Vale ressaltar, todavia, que atualmente é visualizado um recrudescimento da inflação no país, corroendo o poder de compra da população e aumentando as desigualdades. Além disso, os efeitos das guerras em curso da Rússia contra a Ucrânia e de Israel contra o Hamas despertam suspeitas quanto ao modo que os Estados Unidos se colocam no mundo, ditando um sistema “extorsivo de proteção” sem precedentes (Payne e Silver, 2022). Assim, o nível de popularidade do presidente em curso despencou do início de sua posse para cá, gerando dúvidas quanto ao futuro da gestão do país.  O que a incapacidade de sucessivos governos de romperem com o ideal de primazia dos EUA resultou foi em uma situação de “dominação sem hegemonia” da nação, na qual eles desempenham papel cada vez mais disfuncional no mundo (Ibid.). Desse modo, demonstra-se a limitação norte-americana de se dispor como a principal potência global neste novo século. Parafraseando Richard Lachmann (2020): à medida que o navio que são os EUA afunda, um novo capitão faz a diferença?   Nova década, novos problemas      Incapaz de gerir por mais 4 anos uma das maiores potências mundiais, Biden deixou sua candidatura à presidência a partir de 2025 para a vice, Kamala Harris, que atualmente concorre com o ex-presidente Donald Trump.    Independentemente de qual seja o próximo presidenciável, as frentes múltiplas das crises — social, política, migratória e ambiental — tornam-se cada dia mais latentes, demandando um reposicionamento dos EUA diante do cenário internacional para a manutenção de sua imagem. Desde o agravante da pandemia de COVID-19, os índices de bem-estar social norte-americanos têm se deteriorado. Relatórios mais recentes de diferentes organizações mostram que o nível de pobreza da nação vem aumentando nos últimos anos. Além disso, o enfraquecimento de normas ambientais e a suspensão de diferentes exigências de monitoramento ambiental refletem em pioras nos indicadores ambientais. O recrudescimento da migração, sem políticas adequadas de refúgio, também marginaliza parcela significativa da população. Outro fator simbólico é, também, a crise na saúde pública, ocasionada pela epidemia de Fentanil e outros opioides (HRW, 2021; U.S. Social Indicators, 2024; Moslimani e Passel, 2024).      Em adição, o Relatório de Avaliação de Ameaças Anual de 2024, em seu escopo, inclui concorrência estratégica entre potências, papel de atores não estatais violentos, desafios transnacionais — como as mudanças climáticas — e a proliferação de armas de destruição em massa como principais temas de ameaças existenciais aos EUA. Atribui às ameaças extremistas internas um papel central, cada vez mais articulado por meio das redes digitais, e coloca a China como principal adversária (Office…, 2024). No geral, a inaptidão de gerenciar crises internas e externas aponta para um enfraquecimento progressivo da liderança dos EUA. A candidatura de Harris carrega consigo a responsabilidade de enfrentar uma conjuntura marcada por tensões exacerbadas e incertezas, enquanto a volta de Trump representaria a intensificação das divisões internas da sociedade e uma possível retração das alianças multilaterais dos EUA recuperadas ao longo dessa última gestão. Em análise recente de Stuenkel (2024), a vitória do ex-presidente seria celebrada em Moscou, Buenos Aires, Jerusalém, Budapeste, Riade e Pequim.  Outrossim, no debate mais recente de ambos candidatos, foi possível visualizar uma diferença considerável entre a compostura política de ambos. Trump rechaçou seu discurso com falas agressivas, já Harris adotou um discurso mais conciliador (BBC, 2024). O modo de gestão perante crises ficou explícito: ao passo que Harris mantém um perfil mais defensivo, Trump “promete que acabará com elas” (CNN Brasil, 2024). Para Kissinger (2014), a compreensão do legado de qualquer líder depende de uma avaliação de médio e longo prazo dos impactos de suas decisões, e, até o momento, o que se vê são ciclos de políticas que não resolvem as causas subjacentes das crises enfrentadas, com tentativas de contenção que não abordam questões estruturais, como a desigualdade crescente, o radicalismo político e a perda de competitividade econômica em relação a outras potências. Assim, qualquer que seja o resultado eleitoral, o modo do próximo presidente de reposicionar os EUA como um ator confiável e capaz de liderar globalmente dependerá não apenas de recuperações econômica e social robustas, mas também de uma postura política que apazigue as divisões internas e reconstrua a confiança na governabilidade do país — caso contrário, o novo capitão deixará o navio afundar.  Considerações finais O ínterim Trump demonstrou uma mudança significativa no modus operandi da política norte-americana, colocada em xeque pelo prejuízo que isso trouxe à imagem da nação. Contudo, é impossível dissociar o cerne dessas crises recentes com a empreitada da Guerra ao Terror e todas as suas implicações políticas e sociais. Logo, a política dos Estados Unidos nas últimas décadas revela um cenário repleto de crises interconectadas, demandando um líder que enfrente os desafios econômicos e sociais e a profunda crise de legitimidade que assola o país. As tensões internas, exacerbadas por uma retórica divisiva e uma crescente insatisfação popular, ressaltam a necessidade urgente de um reposicionamento estratégico. Nesse viés, o próximo presidente deverá não apenas implementar políticas eficazes e estratégicas para combater as desigualdades sociais, mas também cultivar um diálogo que reconcilie as diversas parcelas da sociedade americana.  Seja Harris, seja Trump, fato é que o próximo presidente norte-americano deverá se preocupar com diferentes variáveis ao longo de sua gestão. Uma vez que a figura presidencial é incumbida de muito peso político, e se acima de tudo a preocupação final da política dos Estados Unidos é sua manutenção como uma potência global, fica claro que o próximo presidente despenderá muito esforço pela frente, ou então a nação se mostrará efetivamente em declínio.    ¹Trecho retirado do discurso de Joe Biden na 79ª Sessão da Assembleia Geral da ONU: “New challenges, new threats, new opportunities were in front of us.”   Referências bibliográficas   ABC NEWS. Generic ballot: 2024 Polls. FiveThirtyEight. Disponível em: https://projects.fivethirtyeight.com/polls/generic-ballot/2024/?ex_cid=abcpromo. Acesso em: 17 set. 2024.   BBC. Obama, o Nobel da Paz que se tornou o 1º presidente dos EUA a estar em guerra durante todos os dias de seu governo. BBC News Brasil, 2017. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-38642556.   BBC. Primeiro debate entre Trump e Kamala Harris discute aborto, legado de Biden e invasão ao Capitólio - BBC News Brasil. BBC News Brasil. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/c4gdn92qye1o. Acesso em: 17 set. 2024.   BIDEN assina 17 decretos e reverte políticas de Trump. DW, 21 jan. 2021. Disponível em: https://www.dw.com/pt-002/biden-assina-17-decretos-e-reverte-pol%C3%ADticas-de-trump/a-56299336. Acesso em: 26 set. 2024.   CASTRO SANTOS, M. H. Exportação de democracia na política externa norte-americana no pós-Guerra-Fria: doutrinas e o uso da força. Revista Brasileira de Política Internacional, v. 53, n. 1, p. 157-191.   CNN BRASIL. Trump promete encerrar guerras na Ucrânia e Israel. CNN Brasil. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/eleicoes-nos-eua-2024/trump-promete-encerrar-guerras-na-ucrania-e-israel. Acesso em: 17 set. 2024.   EVANS, Gareth. When is it right to fight? Survival, vol. 46, no 3, 2004.   HRW. 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