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Mercy Mercy Me: avanços e retrocessos da agenda ambiental na Era do Antropoceno
Mercy Mercy Me: avanços e retrocessos da agenda ambiental na Era do Antropoceno Camila Gomes Oh, mercy, mercy me Things ain't what they used to be What about this over crowded land? How much more abuse from man can she stand? - Mercy Mercy Me, Marvin Gaye Ondas de calor na França, incêndios florestais no Havaí, inundações na Líbia, chuvas extremas no Sul do Brasil, secas históricas no Nordeste e queimadas sem precedentes em biomas brasileiros. O que esses acontecimentos têm em comum, para além de serem considerados "naturais", são seus aspectos acentuados quando comparados com ocorrências similares observadas no passado. Muitas dessas mudanças em acontecimentos naturais são, hoje, atribuídas a um conceito ainda pouco internalizado nas ciências sociais e humanas (Viola; Basso, 2016): o Antropoceno. Ainda que mudanças periódicas do clima e a ocorrência de determinados fenômenos naturais sejam esperadas em função de especificidades geográficas de diferentes regiões, episódios extremos e atípicos como os observados atualmente têm sido debatidos em diferentes esferas ao redor do mundo. Notadamente a partir de 1970, a temática apresentou um crescente grau de relevância nas discussões internacionais e em ações de âmbito global que visavam, em algum grau, conscientizar, mitigar e/ou conter a continuidade do impacto humano no ecossistema terrestre. Nesse contexto, pretende-se discutir na presente análise alguns dos maiores desafios para a definição e implementação de políticas ambientais em contexto global desde a década de 1990, assim como uma breve exploração sobre a Agenda 2030 e seu desempenho até 2024. Delimita-se tal período considerando a crescente evidência da agenda ambiental desde então, a começar pela criação da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas em 1992, e sua atual relevância. Pretende-se, a partir disso, ampliar a compreensão do por quê, se a contenção das mudanças climáticas é tão importante para áreas diversas como socioeconômicas (Gasper; Blohm; Ruth, 2011; Tol, 2018) e securitárias (Rashid et al., 2011), decisões nesse âmbito parecem ser tão custosas para os Estados ao ponto de serem preteridas com frequência. Controvérsias e desafios para a implementação de políticas ambientais globais A Era do Antropoceno, marcada pelo maior impacto das ações e interferências humanas no planeta (Pereira; Freitas, 2017), tem ganhado cada vez mais notoriedade. Tal destaque, porém, não é necessariamente positivo; em muito, a maior atenção para a Era tem se dado em decorrência da maior frequência e intensidade de fenômenos naturais. Seus efeitos são, na atualidade, observados em diversas partes do mundo e, tão diversas quanto suas formas, são suas consequências. Tamanha diversidade complexifica um processo já difícil de estabelecimento de políticas eficientes pelos Estados na temática por exigir ações plurais e coordenadas entre múltiplos atores, estatais e não estatais. Sem que ações conjuntas de mitigação sejam estabelecidas, os esforços individuais de países tornam-se menos efetivos ao ponto de pouco resultarem em mudanças efetivas à região. Portanto, considerando os efeitos transfronteiriços das mudanças climáticas, é imprescindível que ações em prol do clima não sejam implementadas isoladamente (Barros-Platiau; Varella; Schleicher, 2004) em âmbito nacional. Ainda que estas sejam importantes, devem estar em consonância com políticas aplicadas em âmbito internacional – e, mais que isso, devem ser parte de um esforço global conjunto. A Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), de 1992, determina que: [...] as Partes devem proteger o sistema climático em benefício das gerações presentes e futuras com base na equidade e em conformidade com suas respectivas capacidades. Em decorrência disso, os países desenvolvidos que participam da Convenção devem tomar a iniciativa no combate à mudança do clima e seus efeitos, devendo considerar as necessidades específicas dos países em desenvolvimento, em especial os particularmente vulneráveis aos efeitos negativos da mudança do clima. Além do exposto, e reconhecendo as divergências existentes entre os Estados, a Convenção Quadro ainda apresenta o que conceitua como "responsabilidades comuns, porém diferenciadas". Ao tempo em que demonstra como as responsabilidades de cuidar do meio ambiente são comuns a todos os países, tal termo abrange a existência de desigualdades e considera que, como nem todos os países partem de um mesmo ponto, não há como terem todos o mesmo grau de responsabilidade na busca pela proteção ao meio ambiente. Com isso em vista, os países considerados desenvolvidos teriam obrigações – voluntárias, uma vez que, de modo geral, convenções e tratados na temática de meio ambiente não possuem efeito vinculante – mais ambiciosas e abrangentes do que países em desenvolvimento. Tal distinção se dá, principalmente, em função dos respectivos poderes econômicos superiores de países considerados desenvolvidos (em muito conquistados a partir de processos intensos de degradação do meio ambiente e de aumentos acentuados nas emissões de gases de efeito estufa). A ideia de compromissos voluntários sucedeu-se em documentos seguintes, flexibilizando e possibilitando saídas para que os compromissos assumidos não fossem cumpridos caso estes em algum momento surgissem como barreiras para outros objetivos priorizados pelos atores. O respeito à soberania dos Estados, princípio primordial para a manutenção do atual sistema internacional, surge como frequente impasse no estabelecimento de políticas globais mais rigorosas. Sem um ator fiscalizador e que possua capacidade de supervisionar e coagir a implementação de políticas eficazes – ou, ao menos, as pré-estabelecidas –, não há garantias de que os Estados agirão de acordo com o definido na UNFCCC (1992), protegendo o sistema climático em prol das gerações presentes e futuras. Para além, outro fator que dificulta consideravelmente a implementação de tais políticas é a ausência de consenso no cenário internacional sobre como instituir políticas de contenção, sem que isso beneficie determinadas nações em detrimento de outras. Tal posicionamento segue em direção contrária ao conceito de "responsabilidades comuns, porém diferenciadas", mas aparenta ser a posição atual predominante. Ainda assim, considerando a característica anárquica do sistema internacional em voga, não se pode menosprezar a importância que acordos sem características vinculantes possuem, mesmo com a ausência de obrigatoriedade por parte dos signatários. Nesse sentido, a Agenda 2030, um Plano de Ação Conjunto resultado da COP21, surge como a iniciativa recente que mais se popularizou fora da agenda estritamente ambiental. Tal popularização, porém, não necessariamente representou ampla implementação de ações que buscassem alcançar os objetivos propostos. A Agenda 2030: um fracasso envolto de pequenos progressos Seguindo a ideia central implementada na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992, a ideia de desenvolvimento sustentável e de "governança por metas" (Galvão, 2022) volta a ganhar grande destaque na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. O referido Plano de Ação, compromisso assumido pelos 193 Estados-membros da ONU em 2015, propõe uma governança a partir de objetivos globais e se sustenta em três pilares imprescindíveis para o alcance de um desenvolvimento sustentável: social, ambiental e econômico (ONU Brasil, 2015; Galvão, 2022). Tais pilares se dividem e convergem em 17 eixos temáticos, os denominados "Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)". A Agenda propõe, através dos ODS, participação ativa de atores não-estatais, reconhecendo, por meio disso, que dificilmente os objetivos audaciosos poderiam ser alcançados sem cessão de parte da soberania estatal para isso. Os referidos objetivos abrangem estratégias e metas a serem alcançadas até 2030, de forma a, dentre outros, “proteger o planeta da degradação [...] tomando medidas urgentes sobre a mudança climática, para que ele possa suportar as necessidades das gerações presentes e futuras” (idem.) antes de alcançar o ponto de não retorno. A realidade é que, considerando que se, atualmente, a humanidade vive em seu auge de disseminação de informação, avanços tecnológicos e criação de renda, a implementação de agendas que visam garantir a manutenção do planeta de forma a “suportar as necessidades das gerações presentes e futuras” (ONU Brasil, 2015), por se tratar de consequências comuns, não deveria ser tão desafiadora. Ainda assim, é. Em uma crise do multilateralismo, em que a vontade política de cooperar em âmbito mais amplo se dissipa (Barros-Platiau; Soendergaard, 2021) cada vez mais, alcançar as metas estabelecidas ainda parece distante. Há 6 anos de 2030, parece já ser possível prever que o compromisso de “não deixar ninguém para trás” não será alcançado. Sendo um objetivo que já era utópico e demasiado idealista em sua concepção, a proposta da Agenda não deve ser amplamente cumprida (Galvão, 2022) pelos Estados – tampouco suficientemente para conter o atual ritmo de degradação causada pela interferência humana no ecossistema terrestre. Conforme afirmado por Luiz Marques (2023), o colapso ambiental não é mais uma ideia futura e distante, é uma realidade já em curso e, se não contida, tende a uma curva de aceleração cada vez maior. Para mudar o caminho já sendo trilhado, é necessário deter a degradação de ecossistemas e empenhar-se na reconstrução do que foi destruído desde 1950 (Marques, 2023), algo possível apenas em um sistema multilateral que funcione, reconheça e trate a problemática como ela é: indissociável, transfronteiriça e coletiva. No entanto, mesmo em um cenário que não parece favorável, não se pode desconsiderar o papel da Agenda 2030 na democratização das discussões relacionadas ao sistema climático. Mesmo que seus objetivos não sejam alcançados até a próxima década, a Agenda foi responsável por popularizar os processos e a própria discussão sobre desenvolvimento sustentável em âmbito global. A partir de objetivos de desenvolvimento sustentável apresentados de forma simplificada e que se tornam populares, a compreensão da problemática torna-se mais acessível e viabiliza a participação social em maior escala. Presente em tantos ambientes, de inserção em realidades locais à presença mais significativa em espaços decisórios, a Agenda 2030 pode não cumprir com as 169 metas propostas, mas traz luz ao tópico e quebra barreiras ao conseguir se popularizar e incentivar a busca por sua aplicação. Ainda assim, não se pode ignorar a falha (ou ausência de interesse) do sistema internacional em se comprometer, verdadeiramente, com o cumprimento de metas mais audaciosas em prol da mitigação de ações que intensificam as mudanças climáticas cada vez mais. Considerações finais Conforme interpretado por Marvin Gaye na canção Mercy Mercy Me, até que ponto o planeta aguentará em um ritmo acelerado de exploração, como é o atual, sem ir em direção a um colapso definitivo e sem contornos? Conforme defendido por Marques (2023), se mantida a atual tendência humana de interferência, tal futuro, que já não parece tão distante, será definitivamente a nova realidade a qual a humanidade precisará tentar se adaptar em prol de sua própria sobrevivência. Ceteris paribus, as ondas de calor devem ser cada vez mais comuns, assim como incêndios generalizados. Secas, chuvas e calor extremo também tenderão a compor o “novo normal”, ao qual nem todos conseguirão se adaptar. Mesmo com os avanços e estagnações na agenda ambiental desde o início da Era do Antropoceno, é necessário reconhecer, e, ainda mais, compreender a complexidade e intensidade da questão, de forma que esta esteja presente e seja discutida seriamente em âmbito global. Uma possível solução para o problema vai além do puro reconhecimento de sua existência; perpassa por encará-lo de modo realista e buscar por implementações e vontade, principalmente política, para tal. De nada adiantam objetivos utópicos e demasiadamente grandiosos sem que haja o mínimo de comprometimento real com o problema, além de engajamento para que as questões sejam mitigadas e contidas. Como disse Le Prestre (2001), “os problemas do meio ambiente partem do político e finalizam no político”. Ainda que seja verdade, entre o início e o fim há o meio, espaço em que é imprescindível que as diversas camadas da sociedade estejam minimamente em harmonia quanto ao mesmo objetivo: agir em prol da mitigação dos danos já causados pelo homem ao meio ambiente de forma a não alcançar o ponto de não retorno. Ao tempo em que se busque um ritmo de existência, consumo, inovações tecnológicas e interação com o planeta, é preciso buscar também uma trilha que não direcione a passos largos à criação de um ambiente inóspito para uma sobrevivência humana digna. Referências Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em:https://brasil.un.org/pt-br/91863-agenda-2030-para-o-desenvolvimento-sustent%C3%A1vel. Acesso em: 4 ago. 2024. BARROS-PLATIAU, A. F.; SOENDERGAARD, N.. Organizações e Instituições Internacionais. São Paulo: Editora Contexto, 2021. ISBN 978-65-5541-127-0. BARROS-PLATIAU, A. F.; VARELLA, M. D.; SCHLEICHER, R. T.. “Meio ambiente e relações internacionais: perspectivas teóricas, respostas institucionais e novas dimensões de debate”. Revista Brasileira de Política Internacional, Dez 2004, vol.47, no.2, p. 100-130 Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Assinada em Nova York, em 9 de maio de 1992. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2652.htm. Acesso em: 27 jul. 2024. GALVÃO, T. G.. Política Internacional Contemporânea. São Paulo: Editora Contexto, 2022. ISBN 978-65-5541-170-6. GASPER, R.; BLOHM, A.; RUTH, M. Social and economic impacts of climate change on the urban environment. Current Opinion in Environmental Sustainability, v. 3, n. 3, p. 150-157, maio 2011. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S187734351000148X. Acesso em: 14 jun. 2024. LE PRESTRE, P. Ecopolítica internacional. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2001. ISBN 978-8573591453. MARQUES, L. 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As tensões renovadas no Essequibo: uma análise geopolítica
As tensões renovadas no Essequibo: uma análise geopolítica Nathália Rabelo Em dezembro de 2023, milhões de venezuelanos participaram do Referendo Consultivo proposto pelo Presidente Nicolás Maduro a respeito da incorporação do território de Essequibo à Venezuela (Eleitores.., 2023). O Referendo aprovado, composto por cinco perguntas, também questionava se os venezuelanos concordavam com a posição do governo de não reconhecer a jurisdição da Corte Internacional de Justiça (CIJ) sobre o assunto. A reivindicação venezuelana sobre esse território remonta a mais de um século, e as medidas recentes adotadas por Maduro aumentaram as tensões, gerando preocupações sobre uma possível invasão ou conflito armado na região. Em resposta, a população da Guiana organizou manifestações para demonstrar a unidade nacional e reiterar que o território pertence à Guiana, e expressou temor de uma invasão militar venezuelana. No entanto, segundo Thomas Singh, pesquisador da Universidade da Guiana, o "clima" em Essequibo era diferente do restante do país, pois os habitantes não consideravam a possibilidade de uma invasão, entretanto, alguns até chegaram a afirmar que, apesar de se considerarem guianenses, aceitariam uma carteira de identidade venezuelana caso isso fosse necessário para manter a paz (Prazeres; Valery; Paredes, 2024). Destarte, esta análise pretende examinar o histórico das reivindicações, a geopolítica envolvida nas tensões renovadas na região, as implicações dessas tensões e possíveis alternativas para a situação. Reivindicações territoriais As reivindicações sobre o território são uma longa discussão. Cristóvão Colombo foi o primeiro colonizador a “descobrir” as terras em questão, em 1498 (Braveboy-Wagner, 2019, p. 79). A primeira cidade fundada na região foi Santo Tomé de Guayana, em 1595, por Antonio de Berrío, governador nas colônias espanholas (ibid.). Nessa época, expedições de ingleses, holandeses e franceses estavam no território em busca da mítica cidade de El Dorado. Esses exploradores estabeleciam assentamentos, resultando em conflitos entre as nações. Em 1648, como parte do Tratado de Paz de Vestfália, os direitos territoriais de cada nação no Novo Mundo foram confirmados e a primeira prefeitura espanhola foi criada dez anos depois. A primeira subprovíncia foi oficialmente estabelecida em 1762 e, por decreto real em 1768, suas fronteiras eram definidas como “o Atlântico a leste, o Alto Orinoco, Cassiquiare, o Rio Negro a oeste, o Baixo Orinoco ao norte e o Rio Amazonas ao sul” (Braveboy-Wagner, 2019, p. 81). Após conflitos, o governo holandês solicitou aos espanhóis a criação de uma fronteira entre a região do rio Essequibo e do Orinoco. Além das disputas com os espanhóis, os holandeses sofreram ataques britânicos, que tomaram suas colônias da região em 1814. Por sua vez, a Venezuela passava por processo de independência, e em 1811 nasceu a Primeira República (Série…, 2010). Através da figura de Simón Bolívar, em 1819 é criada a Grande Colômbia, território que equivalia as atuais Repúblicas da Colômbia, Venezuela, Equador e Panamá. Na Constituição da Grande Colômbia de 1821, o território foi definido como “el mismo que comprendían el antiguo Virreinato de la Nueva Granada y Capitanía General de Venezuela” (Brewer-Carías, 2023, p. 43). Logo, usando do princípio do direito internacional público de uti possidetis juris, a Grande Colômbia definia suas fronteiras como a mesma de seus colonizadores espanhóis, sendo sua fronteira oriental o rio Essequibo. Em 1830, a Venezuela se separou da Grande Colômbia (Série…, 2010). Em 1835, autoridades britânicas contrataram Robert Schomburgk para delimitar a fronteira, o que resultou em um mapa indicando a foz do rio Orinoco como a fronteira oriental. Ato ao qual a Venezuela protestou, pois perderia grande parte de seu território, e propôs uma Convenção para definir a fronteira. (Braveboy-Wagner, 2019, p. 82). Nesse meio tempo, ouro foi descoberto no território, o que aumentou ainda mais o interesse de ambos pela região e dificultou a busca amigável de demarcar a fronteira, visto que nenhum estava disposto a ceder território para o outro (Braveboy-Wagner, 2019, p. 84). Depois de décadas de conflitos, os Estados Unidos intervieram buscando arbitrar a disputa, com base na Doutrina Monroe. Os esforços dos EUA culminaram no Tratado de Washington de 1897, no qual os americanos foram incumbidos de representar os interesses venezuelanos (Corte…, 2020 ). Foi decidido em 1899, no laudo arbitral de Paris, que a Grã-Bretanha receberia cerca de 90% do território disputado, do leste do rio Orinoco até o rio Essequibo, enquanto que à Venezuela foi concedido a foz do rio Orinoco (El Esequibo…, 2023). De imediato o advogado José María Rojas, representante do Estado e único venezuelano que participou do processo, expôs seus questionamentos quanto à validade da sentença e a imparcialidade dos membros do tribunal arbitral. Era questionada a conduta do diplomata russo, Federik de Martens, que tinha o voto final, pela busca de uma decisão unânime. Alguns documentos e cartas que vieram a público depois denotam que Martens se reuniu com os árbitros para que votassem em favor dos britânicos, caso contrário seu voto seria de acordo com a linha Shomburgk, o que diminuiria ainda mais o território concedido à Venezuela (El Esequibo…, 2023). Em 1962, a Venezuela comunicou as Nações Unidas que o laudo teria sido uma transação política que sacrificava os direitos legítimos de seu país, portanto, o consideravam nulo (Corte…, 2020). Posteriormente, delegações da Venezuela, Reino Unido e Estados Unidos assinaram o Acordo de Genebra de 1966, que estabelecia bases para negociar as fronteiras. Poucos meses depois, a Guiana Britânica, que buscava sua independência, se tornou parte no acordo. (ibid). De 1970 a 2018, as partes passaram por diferentes tentativas de solução. Em 1970 a comissão chegava ao fim sem solução; passaram para o Protocolo de Porto Espanha; em 1990 o então Secretário Geral, Javier Pérez de Cuéllar, definiu o processo de bons ofícios como meio de solução adequado; este ocorreu até 2014, com reuniões periódicas que também não resultaram em nenhuma solução. Em 2015, o Secretário informou que se não encontrassem uma solução prática, o processo seria levado à Corte Internacional de Justiça (CIJ). Em março de 2018 a Guiana apresentou a demanda para a CIJ, que no final do mesmo ano se considerou competente para a solução da controvérsia, mesmo a Venezuela não reconhecendo a jurisdição da Corte sobre a disputa. Recursos naturais e geopolítica regional Em maio de 2015 a empresa americana ExxonMobil fez a primeira descoberta significativa de petróleo no mar da Guiana (ExxonMobil, 2022). Dessa descoberta em diante, a economia do país foi transformada, se tornando o país que cresce mais rápido no mundo, com previsão de um aumento de 38,4% no PIB este ano (Zanfer, 2024). Atualmente, o montante de barris de reservas de petróleo bruto chega a cerca de 11 bilhões e é esperado que até 2028 o país passe a produzir 1,2 mi de barris por dia, o que o tornaria um dos 20 principais produtores de petróleo no mundo (Entenda…, 2023). A produção de petróleo na Venezuela, entretanto, diminuiu consideravelmente na última década, e Maduro considera uma afronta que o petróleo situado à costa do Essequibo, que ainda não foi delimitado após as reivindicações de 1962, esteja nas mãos da empresa americana. Diante disso, Maduro denota que o presidente guianense Mohamed Irfaan Ali é “escravo” da ExxonMobil (OPovo, 2023). É interessante ressaltar que a Guiana não tem uma indústria petrolífera nacional, portanto, a exploração e produção do petróleo depende da atuação das companhias estrangeiras. A empresa americana explora a área chamada de Bloco Stabroek, que abrange cerca de 27 mil km², sendo o poço Liza-1 o primeiro dos mais de 30 poços descobertos no local, que vem se tornando um centro global para a produção de petróleo (ExxonMobil, 2022). Após essas descobertas, a disputa pelo território ganhou novo impulso. Para a Guiana, este petróleo será responsável por aumentar a riqueza e melhorar as condições socioeconômicas no país, que é um dos mais pobres do continente. Já para a Venezuela, que passa por crises políticas, econômicas, migratórias e na indústria petrolífera, vencer essa disputa traria nova esperança para os venezuelanos. Com um considerável percentual de insatisfação entre o povo venezuelano e eleições presidenciais no segundo semestre de 2024, Maduro vê na disputa por Essequibo um apoio nacional quase que unânime. Como demonstrado pelo Referendo Consultivo de dezembro de 2023, a imensa maioria dos cidadãos considera o território como legítimo da Venezuela. Com mais de 10 milhões de votos, 95% dos eleitores votaram “sim” para perguntas relacionadas à criação do estado venezuelano Guiana Essequiba, e sobre a CIJ não ter jurisdição sobre a controvérsia (Eleitores…, 2023). O que Maduro pretendia com o Referendo – se era buscar apoio público à sua reeleição, usar o resultado como motivo para invasão do território ou pressionar a CIJ e outros atores internacionais - não há como saber, mas, para todos os efeitos, algumas medidas foram tomadas pelo governo desde a votação. Foi promulgada, com 39 artigos, a Lei Orgânica para a Defesa de Essequibo, em abril último, que cria a Guiana Essequiba como uma região venezuelana dentro do território (Zanfer, 2024). Além disso, logo após o resultado do Referendo, Maduro instou a Petróleos de VenezuelaS.A (PDVSA), empresa estatal petrolera, a criar a divisão PDVSA-Essequibo e conceder licenças operacionais para a exploração das reservas da região, além de anunciar um prazo de três meses para as petrolíferas que exploram a região atualmente pararem suas atividades (OPovo, 2023). Ainda que essas medidas tenham sido tomadas, é possível perceber um tom mais ameno nas falas de Maduro. Pode-se considerar improvável uma invasão, especialmente com as eleições presidenciais se aproximando e o recente fim das sanções americanas ao petróleo, o que resultou em um momento de recuperação econômica para o país. Ainda assim, a Guiana e outros países da região, inclusive o Brasil, tomaram providências contra uma escalada militar após o resultado do referendo. Roraima, por exemplo, estado brasileiro que faz fronteira com a Venezuela e a Guiana e é destacado por especialistas como a melhor rota para um movimento militar venezuelano de maior porte, recebeu reforço nas tropas e veículos militares (Essequibo…, 2023). Autoridades guianenses informaram que estão atentos à fronteira, tanto em relação às decisões de Maduro quanto a outras circunstâncias, como o sentimento público venezuelano “inflamado” pelo referendo e a possibilidade das pessoas agirem por conta própria contra os guianenses em busca de uma anexação ou pressionar o governo para tomar medidas mais práticas (Essequibo…, 2023). Implicações regionais Neste aspecto, por mais que os ânimos tenham sido apaziguados com o acordo assinado pelos presidentes no final de 2023 que proíbe ameaças e o uso da força, a renovação das tensões entre os dois países implica uma insegurança regional em vários aspectos. Em maio último, a embaixada dos Estados Unidos na Guiana anunciou realização de exercícios militares sobre o território, ao que autoridades venezuelanas reagiram afirmando ser uma “provocação e ameaça à paz” e que “atende aos desejos sem limites da ExxonMobil que pretende desestabilizar a região” (EUA anunciam…, 2024). Caso parecido ocorreu após o anúncio de um navio de guerra britânico ser enviado à região, ao que Maduro respondeu ordenando uma ação defensiva conjunta das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas próxima à costa do Essequibo (BBC, 2023). Estas ações, realizadas no território que ainda não foi delimitado, inflamam ainda mais as tensões no local. A intervenção de atores tão ligados às reivindicações polarizam ainda mais a região, além de provocar reações entre Venezuela e Guiana, o que pode aumentar o risco de um embate armado, e implicar risco também às embarcações que navegam na área. Estes fatores podem afetar a economia regional, visto que as disputas podem acometer rotas comerciais marítimas importantes para a região, dificultando importações e exportações. Com isto, a exploração, produção e exportação de petróleo pode declinar, o que afetaria muito a economia da Guiana, mas também o fornecimento global e os preços do petróleo. Além de criar instabilidade e desconfiança, o que desestimula investimentos estrangeiros e pode significar também o retorno das sanções econômicas contra a Venezuela. Além de afetar a segurança marítima, outro problema pode ser agravado na região: a migração. Devido às crises econômicas e sociais na Venezuela, o número de migrantes e refugiados já é considerado como uma das maiores crises de deslocamento do mundo (ACNUR, 2024). Dados de abril de 2024 apontam que, em todo o mundo, há cerca de 7,7 milhões de pessoas venezuelanas refugiadas e migrantes, sendo que 6,6 milhões vivem nos países da América Latina e do Caribe (OIM, 2024). De acordo com o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), em janeiro, mês subsequente ao Referendo, o fluxo migratório venezuelano no Brasil já aumentou 8% em relação a dezembro (Brasil…, 2024). Logo, a insegurança ocasionada pelo Referendo proposto por Maduro, pode resultar no aumento de migrantes e refugiados para os países vizinhos, o que repercute na economia, no mercado de trabalho, na segurança, saúde e políticas de assistência social destes países. Outra questão afetada pelas tensões são as relações dos países da região. Nas relações bilaterais, a confiança entre os países pode ser comprometida pela disputa, o que dificulta cooperações em várias áreas importantes para o desenvolvimento dos países. Outro ponto a ser mencionado é o papel dos vizinhos e blocos regionais, como a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) e Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), na mediação pacífica da disputa, pois podem pressionar a Venezuela e Guiana em busca de uma solução eficiente e justa. É interessante citar também que o Brasil, que busca um papel de líder regional, realizou esforços com os presidentes de ambos os países para evitar uma escalada da disputa, entretanto, a demora de uma solução que ponha fim às tensões pode afetar essa imagem no cenário internacional. Considerações Finais A renovação das tensões entre Venezuela e Guiana sobre o território de Essequibo em 2023 trouxe à tona complexas questões geopolíticas, com implicações para a estabilidade regional. O Referendo Consultivo proposto por Nicolás Maduro e as subsequentes ações do governo agravaram a disputa, que possui muitas implicações econômicas e humanitárias. A migração venezuelana, já considerada uma das maiores crises de deslocamento do mundo, pode ser ainda mais exacerbada pelas tensões atuais, pressionando ainda mais os países vizinhos. Desta forma, a busca por uma solução diplomática e pacífica é essencial para a estabilidade da região. A continuidade do diálogo entre os chefes de Estado, a mediação de organismos regionais e internacionais e o respeito ao direito internacional e bem-estar da população devem ser prioridades para ambas as nações. Neste sentido, entre as alternativas para resolver a disputa, estão o apoio e incentivo dos países e blocos da região para negociações diplomáticas que delimitem a fronteira na região do Essequibo, considerando tanto as reivindicações históricas da Venezuela, quanto a população que vive na região; em vista da opinião apresentada pelos venezuelanos no Referendo, é muito difícil que o país decida aceitar a jurisdição da CIJ acerca da disputa, logo, apesar de não ter arbitrado de forma definitiva anteriormente, a ONU e outros organismos internacionais podem ajudar oferecendo alternativas diferentes aos países; e por fim, existe a possibilidade de se criar uma Zona Econômica Especial (ZEE) na região, que integre ambos os países nesse território aduaneiro separado, o que pode resolver as disputas pelos recursos, graças as autorizações, licenças e concessões aduaneiras, fiscais e regulamentares (UNCTAD, 2019) que a ZEE pode oferecer para que venezuelanos e guianenses usufruam das riquezas do local. Referências ACNUR. Venezuela. Disponível em: https://www.acnur.org/portugues/venezuela/#:~:text=Com%20mais%20de%205%20milh%C3%B5es. Acesso em: 4 jun. 2024. BBC. Essequibo: a nova escalada de tensão após Maduro ordenar ação militar “defensiva”. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cg6wxr7e0n0o. Acesso em: 4 jun. 2024. Brasil acolhe mais de 125 mil migrantes e refugiados venezuelanos por meio da Operação Acolhida. Disponível em: https://www.gov.br/mds/pt-br/noticias-e-conteudos/desenvolvimento-social/noticias-desenvolvimento-social/brasil-acolhe-mais-de-125-mil-migrantes-e-refugiados-venezuelanos-por-meio-da-operacao-acolhida. Acesso em: 4 jun. 2024. Braveboy-Wagner, Jacqueline A.. The Venezuela Guyana Border Dispute: Britain's Colonial Legacy in Latin America. Taylor & Francis Group, 2019. Acesso em: 4 jun. 2024. Brewer-Carías, Allan R. 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Oppenheimer and the False Negative Peace
Oppenheimer and the False Negative Peace Vítor Vieira Branquinho “Now I am become Death, the destroyer of worlds” Bhagavad Gita (1998) Introduction The seven times Academy Awards winner, Oppenheimer, directed by Christopher Nolan, makes one year since the launching in Brazil on July 20th, and discusses the history of the creation of the atomic bomb, as well as the life of its creator, Robert Oppenheimer. In the movie, one sees some interesting topics as the theoric-physics aspects of the weapon, the north-american politics by the time and the collaboration in the Manhattan Project for its development. Although, one highlights the dialog between Oppenheimer and the professor Albert Einstein in the end of the movie, which is about the followings of such a powerful weapon as that one. In this dialog, Oppenheimer is concerned about an undermost mathematical probability that the nuclear fission expands unlimitedly and consumes the whole atmosphere, leading the world to its destruction and Einstein was to reassure if the calculations were correct. At the end of the movie, after the bomb was already used, they both meet again and the creator said that the chain reaction that would destroy the Earth had started. This happened because of the outcomes that the weapon brought, not only in the warlike context, but also in the social aspect. Its power had changed how the world conceived wars and politics and how it would be used from then on. Either way, Oppenheimer thought the world would end because of his creation, no matter how it played a part in it (Oppenheimer, 2023). Even so, some scholars, such as Kenneth Waltz (Sagan, Waltz, 1995) and John A. Vasquez (2012), argue that, after World War II, the advent of the atomic bomb created a context that would not allow the happening of wars between great powers. This is known as “negative peace”: the lack of wars and violence (Lawler, 2008). Then, this analysis aims at showing, in the theoretical scope, that, despite scholars’ opinions, the apparent peace is fictitious, given the current conflicts, and the physicist’s prediction could be actually true. For that, it will use Glenn Snyder’s concept of “paradox of stability-instability” (1965), in which the development of the atomic bomb established a world without wars, but also opened the doors to the existence of minor conflicts throughout the globe. The nuclear stability The stability showed itself effective just after the ending of World War II: between two nuclear powers, there were any direct conflicts on a major scale. The Cold War was this trial period in which two rival States, afraid of retaliation, would not strike each other (Mearsheimer, 2001). The balance of power, from this moment, happens because of the invention. Mearsheimer (ibid) claims that if States did not have a reason to fear the other, they could fear a lot more an armed conflict between them. That way, one says this weapon put an end to all wars. Waltz’s structural realism (1979), in spite of disagreeing with some of Mearsheimer’s assumptions, also defends a balance of power coming from the bomb. Even though the destruction caused by it is chaotic - and Oppenheimer will be a fierce critic of its warlike use -, Waltz puts it as a guide to peace. According to him, States’ capacity of frightening their enemies with the commitment of not acting beyond this intimidation converges to a balance of power in the international system. That is how the Cold War worked. There was a constant arms race pointing to the State that would show the most efficient weapons and, from it, no nuclear conflict happened (National Geographic, 2022). This demonstrates that the more focused the States are in showing off power to their adversaries, the less willing they are to actually use them. Then, the pillars that sustain this stability - the exhibition of power and fear -, though may seem weak, ensure that no true conflict happens. Finally, it culminates to nowadays, when nine countries detain atomic missiles (CNN Brasil, 2024) throughout the globe: Russia, United States, India, China, France, United Kingdom, Paquistan, North Korea and Israel. The Treaty on the Non-Proliferation of Nuclear Weapons (TNP, 1968) restricted even more the development of more, but this does not change the aimed goal: peace. Neither Mearsheimer, nor Waltz, defended that all countries should have this technology, but that, in a system where power capacities are distributed, a strong conflict of this level should not be feared - even if one fears the rival (Mearsheimer, 2001; Waltz, 1979). One may notice that the atomic bomb stopped being a warlike weapon, but became a political tool (Bell, 2019) to achieve States’ interests. Once there are no large scale international conflicts, due to the fact that they would result in the end of countries, the opportunity for States with unequal capacities to bribe the others emerged. The localized instability In this context, in which a non-aggression behavior between atomic countries was established, they act like a child that, owning the toy, sets the game rules and, if the other wants to play with it, they must follow what was said. Mark S. Bell (2019) claims, in his nuclear opportunism, the bargain power that States with this warlike capacity have and how they utilize it to acquire their goals. To him, States can use it to reach six political behaviors, depending on the desired end: aggression, expansion, independence, bolstering, steadfastness and compromise. Apart from the purpose, the end is the same: prevalence of the most powerful. There is, then, an imbalance in international relations. Given that no nuclear State will strike the other afraid of retaliation, they themselves can run after their political objectives. Hence, nuclear weapons energize, instead of undermining, political ambitions (Bell, 2019). This means that, now that it has this capacity, a State might follow his desire without impeding, something it would not do if it did not have such a weapon. For instance, the War on Ukraine is one in which this can be seen. Since Russia does not have a rival that blocks its advance and it has the power to bargain itself through the Ukrainian territory, it becomes useless to fight its victory: from a realist perspective, there is no way Russia is not conquering Ukraine (Loureiro, 2022). Moreover, beyond the use itself of the bomb, Geller (1990) argues that violence between countries is still going to happen. If a country does not want to use nuclear force or there is a strong interest of a non-nuclear State in a given conflict, military forces still will be used. Anyway, violence continues. The War on Ukraine is also an example here: Russia does not want to destroy nuclearly Ukraine’s territory because it wants to empower itself from it and Ukraine - that does not have atomic bombs - wants to maintain its territory, despite the ways for it (BBC News, 2022). Another conflict that highlights itself is the Israel-Palestine one. Without nuclear weaponry, both fight for its interests, lacking a categorical mediation able to end the dispute. Israel can not use atomic bombs because it would suffer from international retaliation, and, knowing this, Palestinians keep striking Israel, fearless of the nuclear reaction. Thus, the conflict remains (CNN Brasil, 2024). One realizes, therefore, that even though the atomic bomb brought some stability in world conflicts, there are still a lot happening currently - in addition to those cited here - and that do not have a simple and fast way to solve it. Instability happens when countries search for their own interests, without having external breaks able to stop them, and, even if they use military force, getting closure to them by the end. Conclusion Summing up, given that negative peace is the lack of conflicts and the use of violence, it is meaningless to assure that the international system lives in it. The stability-instability paradox suits as a disproof to this acclamation, once instability exists. States still search their interest and they will always do (Morgenthau, 2003), in spite of the way they use to do it - the atomic bomb became only a new one. Economic, territorial, ethnic and religious factors still are reasons for wars, even in levels lower to the Great Wars. By any means, people suffer from those conflicts, human rights are breached and the development of nations is blocked despite the premise of growth in others. In the end, Oppenheimer may be worried about human destruction by his creation, however, though it was the main way for it, the bomb opened the doors for new policies and strategies and people will suffer along because of it indeed. References ALÉM de Rússia e Estados Unidos: Saiba quais países têm armas nucleares. CNN Brasil. Brasília, 2024. 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Destaques
O fracasso da Conferência de Paz na Suíça sob a ótica do conceito de peacebuilding
O fracasso da Conferência de Paz na Suíça sob a ótica do conceito de peacebuilding Maria Fernanda Pimentel Introdução No dia 15 de junho de 2024, líderes mundiais se reuniram em cúpula sediada na Suíça com o objetivo de discutir e traçar possíveis acordos de paz no que tange o conflito entre Rússia e Ucrânia. Apesar da adesão volumosa de países, contabilizados em mais de 90 convidados presentes, a iniciativa promovida pelo presidente ucraniano Volodymyr Zelensky sofreu com o desfalque de importantes figuras internacionais, como a República Popular da China e o Brasil (CNN Brasil, 2024c). Neste contexto, a justificativa dos ausentes pautou-se no fato de que Vladimir Putin, presidente russo, não foi convidado a comparecer, o que esvaziaria o sentido da realização de uma conferência, visto que acordos de paz apenas são ratificados em situações onde existe consenso entre as partes envolvidas, como ressaltado na fala de Mao Ning, porta-voz chinesa: “A China sempre insistiu que uma conferência internacional de paz deveria ser apoiada tanto pela Rússia como pela Ucrânia, com a participação igual de todas as partes, e que todas as propostas de paz deveriam ser discutidas de forma justa e igualitária. Caso contrário, será difícil para ela desempenhar um papel substantivo na restauração da paz.” (Chen; Lee, 2024). Como consequência do encontro, foi formulada uma declaração que ressalta a importância da integridade territorial ucraniana e que contou com a assinatura da maioria dos presentes, com exceção de países como Arábia Saudita, Índia, África do Sul, Tailândia, Indonésia, México e Emirados Árabes Unidos (CNN Brasil, 2024b). Além disso, os Estados Unidos, representado pela vice-presidente Kamala Harris, aproveitou a oportunidade para anunciar a concessão de um pacote de 1,5 bilhões de dólares em energia e ajuda humanitária à Ucrânia, o que trouxe ao encontro um clima de otimismo (FDFA, 2024). Em contraponto, é válido questionar o real impacto da conferência na resolução do conflito em questão, visto que tentativas relacionadas a embargos comerciais, relatórios do Tribunal Penal Internacional e outros encontros previamente realizados se mostraram ineficientes. Com o objetivo de refletir sobre tal conjuntura, esta análise faz uso de uma revisão bibliográfica aplicada ao conceito de peacebuilding na tentativa de embasar a afirmação midiática de que a Conferência de Paz na Suíça foi, portanto, um fracasso na construção de um acordo que norteia o fim da guerra. Os conceitos de paz e a aplicabilidade do peacebuilding A princípio, o conceito de peacebuilding foi elaborado sobre três pressupostos básicos que norteiam as operações de paz, sendo eles o consentimento das partes, a imparcialidade, e o não uso da força, salvo exceções de legítima defesa (United Nations, 2015). Entretanto, no período em que foi proposto, o significado de paz era atrelado exclusivamente à ausência de conflitos bélicos, o que se limitava à chamada paz negativa, onde se considera exclusivamente a violência direta (Galtung, 1969). Em seguida, após a Guerra-Fria, a Organização das Nações Unidas ampliou a perspectiva que engloba a paz, além de intensificar sua atuação no cenário internacional: de acordo com dados disponibilizados pela ONU, entre 1989 e 1994 houve o estabelecimento de 20 novas operações de peacekeeping e o aumento de 11 mil para 75 mil peacekeepers (Organização das Nações Unidas, 2014b). Tal atividade constitui o uso de forças militares internacionais, geralmente autorizado pelo Conselho de Segurança da ONU, com o objetivo de manter ou restabelecer a paz em áreas de conflito (United Nations Peacekeeping, 2015), e seu conceito é complementar ao de peacebuilding visto que promove a estabilização do ambiente para que, em seguida, seja possível tratar das problemáticas internas do conflito, aplicando os princípios norteadores. Apesar de dividir opiniões, a intensificação das atividades mencionadas colaborou para a construção da ideia de paz positiva relatada na obra de Blanco (2014). O novo significado de paz representa um conceito multidimensional, abarcando não apenas o campo civil-militar, como também o social, político, econômico e territorial, ou seja, nessa perspectiva a conjuntura é analisada de modo a diagnosticar ações intrínsecas capazes de influenciar positivamente na manutenção do status pacífico a longo prazo. Uma justificativa para essa mudança de perspectiva seria o estabelecimento de um território fértil para debates acerca da temática, visto que a iminência de um conflito nuclear no contexto da Guerra-Fria incitava especulações sobre a multidimensionalidade capaz de influenciar na estabilidade de um país (Kemer; et al 2016). Nesta análise, apesar da Rússia e da Ucrânia protagonizarem um conflito direto, será considerado o conceito de paz do ponto de vista positivo, uma vez que esta pode ser encarada como duradoura e preventiva na ocorrência de novas hostilidades. Assim, analisando o processo de peacebuilding sob essa ótica, é possível presumir que sua implementação, comumente realizada através do peacekeeping, deve considerar os fatores multidimensionais de modo a elevar seus critérios de análise e proposta de soluções, a exemplo de uma possível válvula de escape na guerra mencionada. Após revisão bibliográfica, a inclusão de oito pressupostos se revelou essencial ao sucesso das possíveis propostas, pressupostos estes que serão abordados a seguir. Avaliado com maior peso para a temática em questão, o consentimento entre as partes é relembrado por meio da necessária inclusão de todos os agentes interessados, visto que um acordo de paz eficaz só é alcançado através da participação de todos aqueles envolvidos no conflito (Nilsson, 2012). Além disso, de modo a criar um ambiente seguro para a implementação do acordo, é válido pontuar a urgência de inclusão de uma cláusula que trate sobre o desarmamento e a desmobilização das forças combatentes (Doyle, M. W.; Sambanis, N. 2006). Ademais, são necessárias medidas para a reintegração de combatentes (Knight, M.; Özerdem, A. 2004), o estabelecimento de instituições democráticas (Paris, R.; Sisk, T. D. 2009) e estratégias de desenvolvimento socioeconômico (Collier, P. 2007). Por fim, os princípios do peacebuilding incluem a justiça de transição, de modo a reparar crimes cometidos e promover a reconciliação, além da proteção dos direitos humanos e o monitoramento das ações tomadas e firmadas em consenso (Walter, F. 2002). Diante do exposto, é possível afirmar que quaisquer tentativas de acordo entre Rússia e Ucrânia que fujam dos principais pontos descritos possuem uma probabilidade maior de fracasso, como apontado no estudo de Nilsson (2012) acerca da participação dos atores relevantes e sua relação direta com a durabilidade do acordo. A Conferência de Paz Como descrito na seção introdutória, a Conferência não contou com a participação de Vladimir Putin, que sequer foi convidado a comparecer. De acordo com Volodymyr Zelensky, em fala direcionada à comitiva de imprensa, o representante russo não está preparado para dialogar em prol de um acordo de paz, visto que apresentou termos que subjugam o território ucraniano e representam exclusivamente os interesses da Rússia. As três principais exigências, apresentadas em reunião com funcionários do Ministério das Relações Exteriores do país, incluíam a retirada total das tropas ucranianas das regiões de Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhia, sendo os dois primeiros territórios separatistas reconhecidos pelos russos como "Estados independentes" e a região de Zaporizhzhia como palco de importantes instalações nucleares. Além disso, Putin demanda uma promessa de renúncia oficial da Ucrânia no que tange suas pretensões de adesão à OTAN e a adoção de um status neutro diante de ideologias e questões de proliferação nuclear (The Moscow Times, 2024). Ao considerar a necessidade de proteção da integridade territorial ucraniana diante das exigências russas no que tange a possibilidade de um acordo, a Conferência de Paz sediada na Suíça tinha por objetivo discutir possíveis alternativas para iniciar negociações visando o fim do conflito, além de demandar o retorno de prisioneiros de guerra e das crianças ucranianas que, de acordo com denúncia ao Tribunal Penal Internacional, foram levadas para o território russo e disponibilizadas para adoção (O Globo, 2024). Entretanto, apesar do documento oriundo dos dois dias de reunião apresentar as reivindicações da Ucrânia, este não conta com um plano concreto de estabilização dos territórios, demonstrando sua fragilidade no que tange a resolução de conflitos. Conforme a aplicação do conceito de paz positiva aos princípios do peacebuilding, o acordo não pode ser alcançado da maneira como vem sendo pensado, visto que além de excluir um agente primordial, não inclui propostas estruturais passíveis de execução, pecando em todos os pressupostos conceituais mencionados na seção anterior. Diante do exposto, questiona-se a existência de algum efeito prático oriundo do encontro realizado. Analisando a repercussão midiática, fica claro que a Conferência firmou-se principalmente como uma demonstração do compromisso político dos aliados de Zelensky com a garantia da soberania do país (O Globo, 2024), mas tal iniciativa não passa de uma representatividade que evidencia esse apoio coletivo e que, apesar de benéfico, não apresenta um histórico positivo quando direcionado à Rússia (New Statesman, 2024). No que tange a ajuda humanitária concedida pelos Estados Unidos, esta se caracteriza como essencial à realidade ucraniana e pode ser vista como um ponto positivo na temática abordada. Entretanto, o pacote foi negociado previamente à realização da Conferência, não cabendo a ela nenhum crédito quanto a sua liberação. Além disso, considerando a fala de Zelensky durante o evento onde foi ressaltado que a proposta apresentada para acabar com a guerra seria submetida à Rússia após endosso por parte das nações signatárias, é perceptível a presença de uma tentativa de imposição unilateral dos termos que deveriam ser negociados, ferindo novamente princípios básicos de negociações de paz. Por fim, o presidente ucraniano também enfatizou que uma segunda Cúpula de Paz apenas aconteceria mediante o acato das condições propostas, o que descarta a possibilidade de um consenso a curto prazo visto que a Rússia rejeitou previamente tais termos em ocasiões passadas (CNN Brasil, 2024b). Considerações Finais Em conclusão, esta análise pontua que a afirmação midiática que atesta o fracasso da Conferência de Paz sediada na Suíça possui embasamento teórico, visto que esta não cumpriu com seu objetivo principal ao descartar a metodologia proposta pelos princípios do conceito de peacebuilding. Assim, o presidente ucraniano não conseguiu elaborar um plano de paz factível, além de negligenciar a participação russa no processo, esvaziando o sentido de uma Conferência. Ademais, é importante pontuar a inexistência de um consenso entre os convidados presentes (CNN Brasil, 2024b), um fato que demonstra a dualidade do conflito não apenas entre os agentes principais como também na comunidade internacional. No que tange a formulação de um acordo promissor, a complexidade das hostilidades implica a necessidade de um estudo multidimensional, este refletido no conceito de paz positiva dentro do peacebuilding. Não é possível afirmar que tal metodologia seja capaz de solucionar as questões em pauta, mas a sua capacidade de formular propostas com maiores chances de sucesso é um fato, e negligenciar princípios básicos como a participação dos agentes protagonistas não é um caminho sensato. Referências Bibliográficas Bell, C.; 2006. "Peace Agreements: Their Nature and Legal Status." American Journal of International Law, 100(2), 373-412. Blanco, R., 2014. Del Mantenimiento de la Paz al processo de formación del Estado: Um esbozo de los esfuerzos de la ONU para la paz internacional. Foro Internacional, 2, pp.266-318. Chen, L.; Lee, L. China says it will not join Swiss peace conference on Ukraine. Disponível em: https://www.reuters.com/world/china-will-not-join-swiss-peace-conference-ukraine-sources-say-2024-05-31/. Acesso em: 23 jun. 2024. CNN Brasil, 2024a. Kamala Harris anuncia pacote de ajuda de mais de US$ 1,5 bilhão para Ucrânia. 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