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Análise Quinzenal
PET-REL

por Bruna Maciel

 

No domingo, 11 de abril, cerca de nove milhões de eleitores equatorianos dirigiram-se às urnas para votar no segundo turno presidencial de seu país. Na disputa, concorriam o ex-banqueiro Guillermo Lasso, do movimento “Creando Oportunidades” (CREO), e o economista Andrés Arauz, candidato da “Unión por la Esperanza” (UNES).

 

Tendo conseguido a vitória, o presidente eleito Guillermo Lasso se unirá a outros nove políticos proeminentes de direita e centro-direita na presidência de países latino-americanos, incluindo Iván Duque, na Colômbia, Mario Abdo Benítez, no Paraguai, e Jair Bolsonaro, no Brasil. A erupção de crises econômicas, políticas e, recentemente, sanitárias, desenvolveram um cenário favorável para a ascensão dessas lideranças, contrárias àquilo que vinha prevalecendo na América Latina durante as décadas anteriores. A eleição de Lasso é a apenas a manifestação mais recente de uma “onda conservadora” latina que prevalece nos últimos anos.

 

Andrés Arauz era o candidato favorito desde o primeiro turno, no qual conquistou 32,72% dos votos (ZIBELL, 2021). Representante na esquerda no segundo turno, Arauz foi apoiado pelo ex-presidente Rafael Correa (2007-2017) e representava a continuidade do “correísmo” no Equador. O correísmo está associado à política personalista de esquerda, anti-imperialista e de inspiração bolivariana de Correa (SÁNCHEZ, 2019). Seu mandato foi caracterizado, sobretudo, pela concentração de poder, combinando carisma e apoio tecnocrático (MELÉNDEZ; MONCAGATTA; 2017). Algumas das principais propostas de Arauz em 2021 incluíam a melhoria dos níveis de emprego, o apoio a pequenas empresas e uma transição para uma economia pós-petróleo (ZIBELL, 2021).

 

Guillermo Lasso disputou sua terceira eleição presidencial, já havendo perdido para Rafael Correa em 2013 e para Lenín Moreno em 2017. Candidato conservador, Lasso representou na eleição a corrente “anticorreísta”, e, dessa forma, mobilizou a direita equatoriana. Em sua campanha, apoiou a criação de novos postos de trabalho, o aumento do salário mínimo, a atração de investimentos estrangeiros e o combate à fome no Equador (QUIÉN..., 2021). Sua principal bandeira foi o cambio - termo em espanhol para “mudança” - que sua liderança traria a uma população insatisfeita com os rumos da política no país.

 

Na noite do domingo eleitoral, foi anunciada a vitória de Lasso, com 52,36% dos votos. Sua vitória chamou a atenção do mundo diante da virada que o político precisou alcançar para chegar ao poder. Algumas previsões sequer incluíam Lasso no segundo turno das eleições, diante do crescimento da popularidade do candidato Yaku Pérez, ambientalista indígena do movimento Pachakutik. Pérez obteve 19,39% dos votos do primeiro turno, contra os 19,74% do candidato conservador (NOGARA, 2021), uma diferença de cerca de 30 mil votos. Para analistas, os fatores chave da vitória de Lasso foram a unificação da direita, em contraste com a divisão da esquerda (ZIBELL, 2021), além da anulação em massa de votos indígenas a pedido de Yaku Pérez, como manifestação de recusa dos dois candidatos.

 

As crises e a onda azul

 

Desde 2015, a América Latina testemunha um movimento de ascensão política da direita, conhecido como “onda azul” ou “maré azul”, do qual Lasso agora passa a fazer parte. O fenômeno recente é uma resposta à chamada “onda rosa”, que começou em 1999 com a eleição de Hugo Chávez, na Venezuela. 

 

Nos anos seguintes à eleição de Chávez, presidentes alinhados a partidos de esquerda foram eleitos na Bolívia, Chile, Argentina, Uruguai, Paraguai, Peru, no Brasil e no próprio Equador (NOEL, 2015). Segundo Visentini (2015), alguns dos fatores que levaram ao declínio da onda rosa e ascensão da onda azul foram a crise econômica internacional iniciada nos Estados Unidos em 2008, as políticas de recuperação contraditórias dos governos e uma forte mobilização midiático-ideológica a favor do conservadorismo que corroboraram com a emersão das insatisfações das elites nos países latinos.

Alguns momentos marcantes para o início da onda azul foram o impeachment do político da esquerda Fernando Lugo em 2013, até então presidente do Paraguai, e a eleição de Mauricio Macri em 2015, na Argentina, representando o fim de 12 anos de peronismo e, mais recentemente, “kirchnerismo” na política do país. Desde então, uma série de representantes de direita subiram ao poder em países da América Latina, além de outras destituições de presidentes de esquerda, como o impeachment de Dilma Rousseff, no Brasil, em 2016.

 

No momento da eleição de Lasso, o cenário do Equador também estava marcado por uma conjuntura de crise. A pandemia de COVID-19 teve forte impacto na economia equatoriana, com o PIB do país sofrendo redução da ordem de 7,5% no ano de 2020, em comparação a 0,9% no Paraguai, 4,1% no Brasil, 5,8% no Chile e 6,8% na Colômbia (FMI, 2021). As condições de trabalho são precárias, com 4,9 milhões de trabalhadores recebendo menos do que o salário mínimo (ZIBELL, 2021) em um país que soma não mais de 20 milhões de habitantes, e com aumento do desemprego durante a pandemia. Assoma-se a esses fatores a crise política, com a reduzida aprovação do presidente Lenín Moreno e o acirramento das disputas entre o correísmo e o anticorreísmo, assim como a evidente crise sanitária, com mais de 17 mil óbitos decorrentes da COVID-19 já contabilizados no país, o equivalente a cerca de 1.000 óbitos por milhão de habitantes (GOBIERNO DE LA REPÚBLICA DEL ECUADOR, 2021). As múltiplas insatisfações da população alavancam o desejo de mudança na liderança e na forma de fazer política do país, e a oferta de cambio na campanha de Guillermo Lasso torna-se cada vez mais apelativa.

 

A virada da esquerda?

 

Apesar da tendência de crescimento da onda azul observada na maior parte da América Latina, alguns analistas começam a perceber um movimento contrário em alguns países, embora ainda seja lento e tímido.

 

O primeiro sinal da virada surge no México, em 2018, com a eleição do populista de esquerda Andrés Manuel López Obrador à presidência (MANETTO; MOLIN; GORTÁZAR, 2021). Além do México, dois países são, atualmente, protagonistas desse movimento: a Argentina e a Bolívia. O segundo turno das eleições equatorianas elevou os ânimos daqueles que acreditavam que o país poderia se juntar ao grupo; entretanto, o resultado foi outro.

 

Não se pode afirmar com certeza, todavia, que a ascensão desses três governantes marcará um fenômeno político tão preponderante em breve. Ao contrário da onda azul, ainda não é possível identificar com clareza as insatisfações mais recentes dos eleitores latinos que os poderiam tornar novamente em direção aos governos de esquerda. Cada um dos países que supostamente deram início à “virada” elegeram seus presidentes em um contexto interno particular, enfrentando mais ou menos hostilidades de acordo com o cenário político local.

 

Na Argentina, Alberto Fernández venceu uma eleição apertada contra o político de centro-direita Mauricio Macri, que concorria ao segundo mandato. A vitória de Fernández significou a volta do kirchnerismo no país, o que muitos argentinos que optam pela direita consideram “uma catástrofe” (ALBERTO..., 2019).

 

Na Bolívia, a esperança da esquerda veio pela vitória de Luis Arce, do partido Movimento ao Socialismo (MAS), ao qual também pertence Evo Morales. Antes de Arce, a presidência do país esteve a cargo de Jeanine Áñez (2019-2020), que assumiu após a crise que destituiu e exilou Evo Morales em um cenário de acirramento das divergências políticas, violência marcante e instabilidade profunda no país. Ainda que a Bolívia não seja um país com peso político suficiente para conduzir a região latina, a vitória de Arce foi considerada um símbolo importante (MANETTO, 2020). Antes mesmo que fosse empossado como presidente, Arce sofreu um atentado em La Paz, no qual uma banana de dinamite foi arremessada na porta do comitê do partido (LUIS..., 2020). O atentado não deixou vítimas ou feridos.

 

É evidente que a sociedade latino-americana ainda se encontra bastante dividida e, em geral, permanece hostil à virada sobre a onda conservadora. A possibilidade de virada da esquerda ainda está bastante distante de poder ser comparada à onda rosa que foi observada no início do milênio, e muitas expectativas estão sendo recorrentemente frustradas com a eleição de líderes como Guillermo Lasso.

 

Próximos passos: eleições no Peru

 

No mesmo dia em que os eleitores equatorianos elegeram Lasso, os eleitores peruanos dirigiram-se às urnas de seu país para o primeiro turno da votação presidencial, assim como para as eleições para o Congresso.

 

O cenário para os peruanos também não é animador. Após um longo período de desenvolvimento, o Peru foi o país latino-americano que sofreu a maior perda econômica no período da pandemia, com seu PIB registrando uma queda de 11% em 2020 (COTA, 2021). O país já contabiliza mais de 58 mil mortos pela COVID-19, cerca de 400 óbitos por milhão de habitantes, e atingiu o recorde diário de óbitos no dia 18 de abril, com 433 falecidos (ORTIZ, 2021).

 

Após um primeiro turno bastante dividido, estão no segundo turno o candidato Pedro Castillo, representante à esquerda, e a candidata Keiko Fujimori, filha do ex-ditador Alberto Fujimori, representando a direita. Fujimori já anunciou durante sua campanha: “dizemos fora ao comunismo, fora a Maduro, fora a Lula e a esse tipo de ideologias que buscam nos destruir e trazer pobreza” (CANDIDATA..., 2021). No entanto, ainda há a possibilidade de o país participar da tímida guinada à esquerda, uma vez que Castillo obteve a maior quantidade de votos no primeiro turno.

 

As expectativas são baixas e o pessimismo ainda é grande. Eleição a eleição, o cenário político na América Latina indica os passos que deve assumir nos anos seguintes; o fato é que as crises econômica, política e sanitária tendem a, cada vez mais, encorajar os eleitores a buscarem mudanças radicais em suas lideranças.

 

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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CANDIDATA à presidência do Peru, Keiko Fujimori se diz ‘contra comunismo’ e pede: ‘Fora, Lula’. Jovem Pan, [s. l.], 22 abr. 2021. Disponível em: https://jovempan.com.br/noticias/mundo/candidata-a-presidencia-do-peru-keiko-fujimori-se-diz-contra-comunismo-e-pede-fora-lula.html. Acesso em: 22 abr. 2021.

COTA, Isabella. As eleições colocam em prova a economia do Peru. El País, México, 10 abr. 2021. Disponível em: https://brasil.elpais.com/internacional/2021-04-11/as-eleicoes-colocam-em-prova-a-economia-do-peru.html. Acesso em: 20 abr. 2021.

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